Introdução
A Escala de Afetos Positivos e Afetos Negativos (Positive and Negative Affect Schedule PANAS, Watson, Clark & Tellegen, 1988) é hoje um dos instrumentos mais utilizados na investigação de estados afetivos, tanto em adultos quanto em crianças (e.g., Allan, Lonigan & Phillips, 2015; Damásio, Pacico, Poletto & Koller, 2013; González Arratia López Fuentes & Valdez Medina, 2015). De fato, um volume expressivo de estudos de validação e adaptação indicam que a PANAS vem sendo utilizada em países como Brasil, México, Espanha, Colômbia, Portugal, Tunísia e Paquistão (e.g., Carballeira, González & Marrero, 2015; Galinha & Ribeiro, 2005; Mnadla, Elloumi, Hajji & Bragazzi, 2017; Moriondo, Palma, Medrano & Murillo, 2012). O presente trabalho apresenta um estudo de avaliação psicométrica e validação de uma versão brasileira dessa escala em uma amostra nacional.
Em dois dos mais citados artigos da história recente da psicologia (Diener, Suh, Lucas e Smith, 1999), Ed Diener apresenta considerações relativamente similares acerca do que seria o bem-estar subjetivo e, consequentemente, de que forma esse construto poderia ser medido adequadamente. Em “Subjective Well-Being”, Diener (1984) aponta que as pesquisas sobre bem-estar subjetivo tendem a focalizar tanto, as avaliações que as pessoas fazem acerca de suas experiências afetivas no seu dia a dia, quanto as avaliações, de natureza mais cognitiva ou calculativa, as avaliações que as pessoas fazem acerca de sua satisfação com a própria vida. Reconhecendo a contribuição de Andrews e Inglehart (1979), Diener aponta que o bem-estar subjetivo seria então constituído por três componentes gerais: 1) julgamentos que os indivíduos fazem sobre sua satisfação com a própria vida, 2) vivência de afetos positivos e 3) vivência de afetos negativos.
Já em “Subjective well-being: Three decades of progress”, Diener, Suh, Lucas e Smith (1999) apontam que o bem-estar subjetivo pode ser considerado como uma categoria ampla de fenômenos que incluiria respostas emocionais de uma pessoa, sua satisfação com domínios específicos de sua vida e sua avaliação sobre sua satisfação com a própria vida de uma maneira mais geral.
Pode-se afirmar que, contribuições como as citadas acima tiveram grande impacto nos estudos recentes sobre felicidade e construtos relacionados. Em primeiro lugar, pode-se reconhecer que o bem-estar subjetivo, entendido como 1) avaliação cognitiva sobre a satisfação com a própria vida, 2) vivência de afetos positivos e 3) vivência de afetos negativos, é hoje um dos construtos mais estudados na psicologia positiva. Em segundo lugar, como consequência da constatação anterior, um grande número de instrumentos de avaliação psicológica vem sendo desenvolvidos ou testados com o objetivo de avaliar os diferentes componentes do bem-estar subjetivo.
O desenvolvimento da Escala de Afetos Positivos e Afetos Negativos (PANAS)
Em outro artigo de revisão altamente citado, Watson e Tellegen (1985) reanalisaram vários estudos envolvendo medidas de autorrelato, focalizando estados afetivos, e concluíram que análises fatoriais exploratórias consistentemente indicavam a existência de dois fatores 1) Afetos Positivos e 2) Afetos Negativos. Os autores observaram ainda que esta configuração bidimensional também estaria sendo sistematicamente identificada em outras importantes linhas da pesquisa sobre temas como humor ou estados afetivos e que os achados dessas pesquisas, que ofereceriam evidências importantes sobre a estrutura da experiência afetiva humana, teriam relevância em vários campos da Psicologia, como a Psicologia Clínica.
Considerando as conclusões apresentadas por Watson e Tellegen (1985), Watson, Clark e Tellegen (1988) desenvolveram um novo instrumento para avaliação da experiência de afetos positivos e negativos. Entre outros aspectos, esses autores justificaram a necessidade do desenvolvimento de uma nova escala, afirmando que muitas das medidas utilizadas na época, para avaliação de afetos, eram inadequadas, pois apresentavam baixa confiabilidade, ou validade convergente ou discriminante limitada.
O instrumento desenvolvido, uma medida relativamente breve com 20 itens (The PANAS Scales, Escalas de Afetos Positivos e Afetos Negativos, PANAS) se tornou um dos instrumentos mais utilizados para avaliação de afetos em toda a história da Psicologia. De acordo com a Web of Science, nada menos que 12608 trabalhos citaram o trabalho de Watson, Clark e Tellegen (1988).
O desenvolvimento da Escalas de Afetos Positivos e Afetos Negativos (PANAS) pode ser sumariado da seguinte forma: Para ter uma amostra ampla e representativa de descritores de humor, Watson, Clark e Tellegen (1988) tomaram como ponto de partida uma lista de 60 termos que já haviam sido incluídos em estudos fatoriais anteriores (e.g., Zevon & Tellegen, 1982). Os autores relataram que sua maior preocupação foi selecionar termos relativamente puros. Esses termos deveriam poder ser claramente classificados em um dos dois fatores (afetos positivos e afetos negativos). Assim, termos relacionados, por exemplo, a afetos positivos deveriam ter elevada carga fatorial nesse fator e um nível de carregamento praticamente nulo no outro fator (afetos negativos). Os autores especificaram, por exemplo, que um item deveria ter carga fatorial igual ou superior a 0.40 em seu fator e não deveria ter carga no outro fator acima de |.25|.
Reanalisando dados de Zevon e Tellegen (1982), num estudo que envolveu três amostras (164, 50 e 53 participantes), os autores chegaram a uma lista de 10 termos que descreveriam experiências afetivas positivas (attentive, interested, alert, excited, enthusiastic, inspired, proud, determined, strong and active) e 10 termos que descreveriam experiências afetivas negativas. Esses 10 termos cobririam 5 estados emocionais: distressed, upset (distressed); hostile, irritable (angry); scared, afraid (fearful); ashamed, guilty (guilty); and nervous, jittery (jittery).
Na sequência, os autores aplicaram essa escala com os 20 itens, utilizando uma escala Likert com 5 pontos (“very slightly or not at all”, “a little”, “moderately”, “quite a bit”, e “very much”). Os participantes foram solicitados a responder à pergunta “Como você se sentiu” ou “se sente”. Seis instruções temporais diferentes foram utilizados nas perguntas: (a) "right now (that is, at the present moment)"; (b) "today" (today); (c) "during the past few days" (past few days);(d) "during the past week" (week); (e) "during the past few weeks" (past few weeks); (f) "during the past year" (year); and(g) "in general, that is, on the average" (general)....”.
O número de participantes em cada uma das referências temporais foi: 660 (momento), 657 (hoje), 1002 (últimos dias), 586 (últimas semanas), 649 (ano passado). As escalas foram aplicadas e reaplicadas após um intervalo de, por exemplo, 8 semanas. Para cada amostra foram computados dados normativos (e.g. M e DP), assim como consistência interna e estrutura fatorial.
Watson, Clark e Tellegen (1988) reportaram coeficientes de fidedignidade (alfa de Cronbach) entre 0.86 e 0.90 em todas as situações. As correlações entre as escalas de afetos positivos e afetos negativos oscilaram entre -0.12 e -0.23. O coeficiente de confiabilidade teste-reteste para um intervalo de 8 semanas oscilou entre (estabilidade temporal, r), 0.39 e 0.71, todos significativos para p < 0.05. Watson, Clark e Tellegen reportaram ainda correlações entre os escores da PANAS e os escores de outras escalas que envolviam medição de afetos (e.g., Escala de Bradburn, 1969).
Finalmente, considerando que a prevalência de afetos positivos e negativos vem sendo associada a medidas de distress e transtornos psicológicos, Watson, Clark e Tellegen (1988) avaliaram correlações entre a PANAS e três escalas amplamente utilizadas em avaliações clínicas: a Checklist de Sintomas do Hopkins - HSCL (Derogatis, 1974) , o Inventário Beck de Depressão - BDI (Beck, 1988) e a Inventário de Ansiedade Estado - STAI (Spielberger, 1970). Várias correlações significativas e fortes foram identificadas.
Vários estudos avaliaram propriedades das Escalas de Afetos Positivos e Afetos Negativos (PANAS) em amostras brasileiras. Pires, Figueiras, Ribas e Santana (2013), por exemplo, avaliaram as propriedades psicométricas de uma versão da PANAS desenvolvido por Pereira, Calvano e Cunha (1992). O estudo envolveu 354 participantes, adultos de ambos os sexos. Foram conduzidas análises fatoriais exploratórias e análises fatoriais confirmatórias (Partial Credit Model). De uma maneira geral, pode-se dizer que os pesquisadores reportaram propriedades psicométricas excelentes que autorizam a utilização da escala no Brasil. Entretanto, alguns problemas foram identificados. Por exemplo, o item “Me sinto alerta” que na escala original seria um item referente a afetos positivos, não se comportou dessa forma no estudo. Na verdade, o fator de carregamento observado para esse item foi de apenas 0.09.
Em outro estudo Pires, Filgueiras, Ribas e Santana (2013) utilizaram o Funcionamento Diferencial de Itens (DIF) para avaliar comportamentos da PANAS no que diz respeito a sexo. Novamente, os autores identificaram propriedades psicométricas muito boas, mas também alguns indícios de que determinados itens poderiam apresentar propriedades diferentes de acordo com o sexo do respondente.
Carvalho e colegas (2013) conduziram o mais amplo estudo no Brasil com a PANAS até o momento da elaboração deste trabalho. Esses autores avaliaram as propriedades psicométricas da PANAS em uma amostra representativa com 3.728 indivíduos residentes nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, utilizando uma análise fatorial exploratória e modelagem com equações estruturais. As análises corroboraram a bidimensionalidade da PANAS, com Afetos Positivos respondendo por 32,99% da variância e afetos negativos respondendo por 17,06% da variância.
Segundo o relato dos autores, 9 dos 10 itens da Escada de Afetos Positivos original foram retidos (o item orgulhoso não carregou em nenhum fator adequadamente, fator de carregamento < 0,3) e todos os 10 itens da Escada de Afetos Negativos foram retidos. Os itens se comportaram de forma muito parecida com a preconizada pelos idealizadores da escala (Watson, Clark & Tellegen, 1988) com elevados níveis de carregamento em seu fator e baixos níveis de carregamento no outro fator. Alfas de Cronbach para afetos negativos e positivos relatados foram 0.87 e 0.88, respectivamente.
Uma validação da PANAS foi apresentada no compêndio de medidas em Psicologia Positiva organizado por Hutz (2008). Pode-se ainda mencionar que versões da PANAS têm sido desenvolvidas, por exemplo, para avaliação de afetos em crianças (e.g., Damasio, Pacico, Poletto & Koller, 2013)
O presente estudo pode contribuir para o entendimento das propriedades do PANAS no Brasil, uma vez que o estudo realizado envolveu uma amostra com participantes de todas as regiões do país.
Método
Considerações éticas
A presente pesquisa está em consonância com legislação vigente referente a pesquisas envolvendo seres humanos (Conselho Nacional de Saúde, 2008). A pesquisa foi aprovada por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) Comitê de Ética em Pesquisa (cep) da Universidade Estácio de Sá. Aprovação número 57488816.4.0000.5284.
Participantes
Ao todo, 2648 estudantes universitários (1505 do sexo feminino, 1065 do sexo masculino e 88 não informaram sexo), matriculados em cursos de Psicologia e de Engenharia de uma universidade particular com campi em 15 cidades brasileiras (Brasília, Campo Grande, Goiânia, Aracaju, Fortaleza, João Pessoa, Recife, Salvador, São Luiz, Boa Vista, Macapá, Juiz de Fora, Niterói, Rio de Janeiro e Florianópolis) participaram da pesquisa, respondendo um questionário eletrônico que foi disponibilizado na Internet.
Os participantes apresentaram uma divisão equilibrada entre ambos os cursos (Psicologia= 45,6%, Engenharia= 46,9%) com idades entre 18 e 60 anos (m= 27,1), sendo majoritariamente solteiros (61,05% da amostra total). A renda familiar dos participantes variou de um salário mínimo (R$880) a mais de onze salários mínimos.
Instrumentos
- Afetos Positivos e Afetos Negativos. Foi utilizada a Escala de Afetos Positivos e Afetos Negativos (The PANAS Scale, Escalas de Afetos Positivos e Afetos Negativos, PANAS), já foi descrita em detalhes anteriormente. Podemos ressaltar que neste estudo foi utilizada a versão validada por Pires, Figueiras, Ribas e Santana (2013), originalmente desenvolvida por Pereira, Calvano e Cunha (1993).
Os autores conduziram análises fatoriais exploratórias e em teoria de resposta ao item (Partial Credit Model), obtendo os resultados para a Escala Positiva: KMO = 0.89, Alfa de Cronbach (α) = 0.84, um fator responsável por 46% da variância e para a Escala Negativa: KMO = 0.88, Alfa de Cronbach (α) = 0.90, um fator responsável por 47,05% da variância.
- Escala Analógica Visual de Bem-estar Psicológico (FACES). A Escala Analógica Visual de Bem-Estar (Faces Scale, Andrews & Withey, 1976) é uma escala de resposta única. No trabalho de Andrews e Withey (1976) a escala era apresentada apenas como uma das questões de um amplo questionário. Nesse item, solicita-se ao entrevistado que avalie como ele se sente em relação a sua vida como um todo (Which face comes closest to expressing how you feel about your life as a whole?), utilizando sete faces esquemáticas cujas expressões variam desde muita infelicidade (face com os cantos da boca completamente voltados para baixo) a muita felicidade (face com os cantos da boca elevados para cima).
O respondente é orientado a assinalar qual das faces apresentadas melhor representa a forma como a pessoa se sente através de um item único (Andrews e Withey, 1976). Esta é a única escala que avalia como a pessoa sente a sua vida no momento presente e se sente em relação à sua vida como um todo.
Souza e colegas (2012) utilizaram a Escala Analógica Visual de Bem-Estar para avaliar fatores associados ao bem-estar psicológico em 1621 jovens com idades entre 18 a 24 anos residentes em Pelotas, Rio Grande do Sul. O bem-estar psicológico pode ser associado ao não uso de drogas ilícitas, ao trabalho remunerado, à prática de religião, às classes socioeconômicas A e B, à alta escolaridade e a não presença de transtornos psiquiátricos.
- Escala de Felicidade Subjetiva. Foi utilizada uma versão em português da Escala de Felicidade Subjetiva, (EFS, Subjective Happiness Scale, SHS, Lyubomirsky & Lepper, 1999), adaptada e validada por Damásio, Zanon, & Koller (2014). Escala de Felicidade Subjetiva é composta por apenas quatro itens (1. “Em geral, eu me considero”; 2. “Comparado à maioria dos meus colegas/amigos, eu me considero”; 3. “Algumas pessoas, de maneira geral, são muito felizes. Elas aproveitam a vida independentemente do que esteja acontecendo, conseguindo o máximo de cada situação. Em que medida essa caracterização descreve você?”; 4. “Algumas pessoas, de maneira geral, não são muito felizes. Embora não estejam deprimidas, elas nunca parecem tão felizes quanto poderiam ser. Em que medida essa caracterização descreve você?”) que são avaliados em escalas tipo Likert de 7 pontos. Um escore alto indica alto índice de felicidade.
A validação e análise das propriedades psicométricas da versão brasileira do Escala da Felicidade Subjetiva envolveu uma amostra de 600 participantes (Damásio, Zanon & Koller, 2014). Análises fatoriais exploratórias e confirmatórias revelaram excelentes propriedades psicométricas. As análises identificaram um único fator, responsável por 64.21% da variância e alfa = 0.84. No presente estudo, o alfa observado foi de 0.73.
- Escala Índice de Saúde mental. Vários instrumentos têm sido desenvolvidos com o objetivo de contribuir no diagnóstico, tratamento, prevenção de transtornos ou mesmo na promoção da saúde mental. A Escala Índice de Saúde Mental de 5 itens (Five-item Mental Health Index, MHI-5, McHorneye & Ware, 1995) é uma das escalas mais amplamente utilizadas para identificação de indivíduo com níveis importantes de depressão ou ansiedade. Composta por cinco itens, a MHI-5 é uma subescala do SF-36 (36-item Short Form SF-36), um instrumento utilizado para medir a saúde relacionada a qualidade de vida (Damásio, Borsa & Koller, 2014).
Nesse instrumento são apresentadas cinco questões sobre como a pessoa se sentiu durante as últimas quatro semanas (“Quanto tempo você tem se sentido uma pessoa muito nervosa?”, “Quanto tempo você tem se sentido tão deprimido(a) que nada possa animá-lo(a)?”, “ Quanto tempo você tem se sentido calmo(a) ou tranquilo(a)?”, “Quanto tempo você tem se sentido desanimado(a) e abatido(a)?”, e “Quanto tempo você tem se sentido uma pessoa feliz?”.) Para cada questão, são oferecidas 5 opções de resposta: “Todo o tempo”, “A maior parte do tempo”, “Alguma parte do tempo” “Uma pequena parte do tempo” e “Nunca”.
No presente estudo, foi utilizada a versão em português desenvolvida por Damásio, Borsa e Koller (2014). Esses autores conduziram análises fatoriais exploratória e confirmatória que corroboraram uma solução de fator único, com todos os 5 itens com carga sobre o fator esperado, e excelentes indicadores psicométricos. O alfa de Cronbach relatado foi de 0.86. No presente estudo, o alfa observado foi de 0.86.
- Dados Sociodemográficos. Um questionário foi ainda utilizado para coletar informações do tipo sexo, idade, estado em que cursava o curso universitário, tipo de curso universitário (psicologia, engenharias, outros), e a renda familiar do participante.
Coleta de dados
Os participantes receberam, por e-mail, um convite para participar da pesquisa. Os interessados precisavam seguir um link para ter acesso ao questionário online. Na primeira página do questionário foi oferecida uma explicação sobre a pesquisa. Os participantes foram informados que a participação era absolutamente voluntária. Para ter acesso e responder ao questionário propriamente dito, os participantes precisavam responder que entendiam o propósito do estudo e que concordavam em voluntariamente participar.
Análise de dados
Antes de qualquer análise ser conduzida, todas as variáveis estudadas na pesquisa foram analisadas com o objetivo de avaliar as distribuições univariadas e bivariadas através de métodos gráficos (e.g., diagrama de ramo e folha, box-plot) e numéricos (e.g., medidas de curtose) com o objetivo de avaliar normalidade, homogeneidade de variância e a presença de dados extremos (outliers, 3 desvios padrão acima ou abaixo da média). Para fins de execução das análises foram utilizados os softwares IBM SPSS Statistics versão 24.0 (IBM Corp, 2016) e IBM SPSS Amos 22 (IBM Corp, 2013).
Resultados
Escala de Afetos Positivos e Afetos Negativos (PANAS)
A Análise Fatorial Exploratória (AFE) das Escalas de Afetos Positivos e Afetos Negativos (PANAS), (KMO = 0.92; Teste de Esfericidade de Bartlett, (2 (190) = 11249,77, p <.001) (Escala Positiva = KMO: 0.89, Alfa de Cronbach (α) = 0.84, um fator responsável por 46% da variância. - Escala Negativa = KMO = 0.88, Alfa de Cronbach(α) = 0.90, um fator responsável por 47,05% da variância) apresentou uma melhor solução com dois fatores, que juntos representaram 42,95% da variância explicada pelos construtos. Essa decisão também levou em conta o gráfico de sedimentação. Todos os 20 itens carregaram nos seus respectivos fatores com cargas fatoriais satisfatórias e não carregaram em outro fator de forma expressiva (i.e.,> 0.30). A tabela 1 apresenta os resultados da AFE, com os coeficientes de fidedignidade observados.
Uma Análise Fatorial Confirmatória (AFC) foi realizada com a segunda metade da amostra (n2 = 1324) para validação cruzada do modelo exploratório. Foi conseguido um ajuste limítrofe: RMR = 0.03; CFI = 0.91; TLI = 0.90. As cargas dos fatores variaram entre 0.46 (item 3) a 0.64 (item 2) para o primeiro fator 0.41 (item 7) a 0.79 (item 4) para o fator 2.
O modelo só obteve propriedades psicométricas satisfatórias após receber ajustes. Análises fatoriais confirmatórias são notoriamente mais rigorosas que as análises fatoriais exploratórias. A necessidade de ajustes indica que, embora as propriedades psicométricas da PANAS sejam, de uma maneira geral, adequadas para utilização no Brasil, algumas modificações na escala poderiam aprimorar o instrumento. Por exemplo: pelo menos três ajustes foram relacionados com o item 9 (“Alerta”). Essa palavra (Alerta) pode ter um significado positivo, do tipo estar atento, mas também pode ter um significado negativo, do tipo estar se sentido alarmado. Acreditamos que novos estudos devam ser feitos com intuito de avaliar esse ítem. Tabela 2, Figura 1
Avaliação de Validade Convergente
Para avaliar a validade concorrente das Escala Afetos Positivos e Escala Afetos Negativos (PANAS), foram avaliadas correlações de ordem 0 entre essas medidas e a Escala Visual de Bem-estar Psicológico, a Escala de Felicidade Subjetiva e a Escala Índice de Saúde Mental - 5. Nessas análises, foi utilizada a amostra total (n = 2648).
Nas associações entre as propriedades psicométricas da Escala Afetos Positivos e Escala Afetos Negativos (PANAS) e variáveis sociodemográficas, participantes do sexo masculino apresentaram significativamente (p < 0,05) mais Afetos Positivos (m= 3,48) e menos Afetos Negativos (m= 1,96) que as participantes do sexo feminino. (Positivos m= 3,19 - Negativos m=2,18). Pode-se afirmar que as magnitudes de efeito entre essas diferenças foram médias para algumas das medidas (Afetos Positivos, Afetos Negativos, Bem-estar Subjetivo). Para renda familiar e idade, os coeficientes de correlação obtidos (p< 0,01) foram baixos tanto para os afetos positivos quanto para os negativos. (Idade: 0,12 e -0,09 / Renda Familiar: 0,07 e -0,06, respectivamente). Na relação entre o tipo de curso e afetos, estudantes de engenharia apresentaram significativamente (p < 0,05) mais Afetos Positivos (m= 3,40) e menos Afetos Negativos (m= 2,01) que os estudantes de psicologia. (Positivos m= 3,22 - Negativos m=2,16).
Discussão
Como se pode observar na Tabela 3, foram identificados coeficientes de correlação bastante expressivos. Esses coeficientes indicam grande convergência entre todas as medidas consideradas. Esses resultados corroboram estudos nacionais e internacionais anteriores, por exemplo, Damasio, Pacico, Poletto e Koller (2013) e Pires, Figueiras, Ribas e Santana (2013).
Pode-se destacar, por exemplo, uma correlação positiva e significativa entre a Escala de Afetos Positivos e a Escala de Bem-Estar Subjetivo (0.84), assim como a correlação negativa e significativa entre a Escala de Afetos Negativos com a Escala de Bem-Estar Subjetivo (-0.76). Desta forma, a percepção de afetos, positivos e negativos, se apresenta como um elemento preditor do Bem-estar subjetivo como aponta o modelo proposto por Diener (1984).
Outra correlação forte encontrada foi entre a Escala de Afetos Negativos e a Escala Índice de Saúde Mental - 5 (-0.72), exibindo uma correlação negativa e significativa, de modo que a experiência menor de afetos negativos se encontra relacionada com uma melhor percepção de saúde mental. A Escala Índice de Saúde Mental - 5 também apresentou correlação significativa, porém positiva com a Escala de Afetos positivos (0.63), estes achados indicam que a ausência de afetos negativos possui maior impacto na avaliação da percepção de saúde mental do que a maior experiência de afetos positivos.
Por outro lado a Escala de Afetos Positivos apresentou uma correlação maior com a Escala de Satisfação com a Vida (0.52) do que a Escala de Afetos Negativos (-0.44). Desta forma, podemos ressaltar que a experiência de Afetos Positivos possui maior impacto na percepção de satisfação com a vida experienciada pelo indivíduo.
As pesquisas envolvendo Felicidade, Bem-estar subjetivo e variáveis sociodemográficas tem produzido resultados complexos e, muitas vezes, contraditórios. Entretanto, acredita-se que é seguro afirmar que os resultados obtidos corroboram com estudos anteriores robustos e reconhecidos com comparações de sexo (Haring, Stock e Okun, 1984, Tesch-Romer, Motel-Klingebiel e Tomasik, 2008) idade e status socioeconômico (Kahneman & Deaton, 2010) enquanto não foram encontrados na literatura elementos que discorram sobre diferenças de curso de graduação.
Conclusão
Os dados obtidos no presente estudo corroboram com estudos realizados anteriormente e indicam que a PANAS apresenta propriedades psicométricas satisfatórias que apoiam sua utilização no Brasil.
As análises de correlação da escala PANAS com outros instrumentos, como as escalas de Índice de Saúde Mental e de Bem-Estar demonstraram e confirmaram os resultados esperados, que uma menor dimensão de afetos negativos e maior dimensão de afetos positivos levam à uma melhor percepção de saúde mental e um maior índice de bem-estar subjetivo. Isto indica a validade convergente das escalas, dando maior confiabilidade ao instrumento.
No entanto, devido a quantidade de ajustes necessários para a obtenção de propriedades psicométricas satisfatórias, as análises apontam também para a possibilidade de aprimoramento do instrumento, especialmente em relação aos termos utilizados em sua composição, devido a diferença de significados e abrangência dos mesmos em diferentes idiomas.
Deste modo, embora a escala seja satisfatória na mensuração de seu objeto e confiável em seu uso nacional, recomendam-se novos estudos a respeito de itens específicos da escala e possivelmente uma revisão dos termos que compõem esta versão da mesma.