Incêndios florestais, aumento da temperatura global, derretimento das calotas polares, poluição de rios e oceanos e o risco de extinção de diversas espécies animais são apenas alguns exemplos dos efeitos catastróficos que os seres humanos podem causar ao meio ambiente. No Brasil, a biodiversidade é severamente ameaçada em razão da ação humana. Por exemplo, na Amazônia, entre 77,3 % e 85,2 % das espécies em risco de extinção tem o seu habitat afetado pelos incêndios (Feng et al., 2021). Já no Pantanal, em 2020 foram registradas as maiores queimadas da sua história, com 26 % do bioma destruído e 17 milhões de vertebrados mortos (Tomas et al., 2021). Ademais, recentes desastres ambientais, como os de Brumadinho e Mariana, acentuam os sérios problemas ambientais do Brasil, que tem se configurado como um contexto marcado pela impunidade contra os crimes ambientais.
As ações humanas causam um desequilíbrio ao meio-ambiente e isso consequentemente acaba trazendo implicações para os próprios seres humanos. Por exemplo, os incêndios florestais no Brasil estão relacionados ao aumento de hospitalizações por doenças respiratórias (Rocha, 2016). Na Colômbia, a exposição ao mercúrio, descartado em rios, está relacionado a um decréscimo em habilidades neurocognitivas em crianças e adolescentes (De la Ossa, 2021). Eventos relacionados a mudanças climáticas têm afetado a saúde mental das pessoas, especialmente aquelas que vivem em países em desenvolvimento (Palinkas & Wong, 2020), como o Brasil. Portanto, é necessário identificar predisposições individuais que podem explicar em alguma medida comportamentos pró e antiambientais.
Dentro deste contexto, a psicologia possui um papel central, de modo que a diminuição da crise ambiental depende de mudanças a nível individual (Zelezny & Schultz, 2000). Para propor intervenções que promovam ações pró-ambientais é necessário conhecer os preditores sociopsicológicos de tais comportamentos e das atitudes em relação ao meio-ambiente (Baldwin & Lammers, 2016). Nesta direção, Milfont (2021) indica que os traços de personalidade e as atitudes socioideológicas formariam as bases sociopsicológicas do ambientalismo.
Ambientalismo, traços de personalidade e atitudes socioideológicas
De forma geral, o ambientalismo pode ser conceituado como processos associados com ações que objetivem diminuir os impactos do homem na natureza (Zelezny & Schultz, 2000). Considerando o modelo dos Cinco Grandes Fatores de personalidade (CGF), amabilidade, conscienciosidade e abertura tem predito consistentemente o ambientalismo (Hirsh & Dolderman; 2007; Milfont & Sibley, 2012). Outro modelo de personalidade utilizado para o entendimento do ambientalismo é o HEXACO, tendo o fator honestidade/humildade como o preditor mais consistente (Milfont, 2021). Ademais, traços de personalidade explicam diferenças de sexo no ambientalismo, pois as mulheres são mais empáticas (Milfont & Sibley, 2016), amáveis, conscienciosas, honestas e humildes em comparação aos homens (Desrochers et al., 2019), tendo, consequentemente, mais atitudes e comportamentos pró-ambientais.
Apesar do papel importante dos CGF e do HEXACO para a compreensão do ambientalismo, cabe destacar os efeitos destrutivos que os seres humanos causam a natureza. Neste contexto, é fundamental explorar o papel que o lado sombrio da personalidade pode ter para explicar baixos níveis de ambientalismo. Na literatura, um modelo que cobre esse lado aversivo da personalidade humana é a Tríade Sombria, formada por maquiavelismo e pelas variações subclínicas de psicopatia e narcisismo (Paulhus & Williams, 2002). De acordo com esses autores, esses traços são marcados por tendências para a autopromoção, frieza emocional e agressividade, descrevendo pessoas que tem comportamento explorador e usam os demais em benefício próprio. Ademais, o núcleo da tríade sombria da personalidade é marcado por baixos níveis de amabilidade (Gouveia et al., 2016) e honestidade/humildade (Book et al., 2015), além de déficits na empatia afetiva (Wai & Tiliopoulos, 2012).
Recentemente, autores verificaram que a psicopatia e o maquiavelismo se associam negativamente ao apego ao lugar e a atitudes pró-ambientais (Huang et al., 2018). Observou-se, ainda, que a psicopatia medeia a relação entre sexo e ambientalismo, sendo que homens tem menor nível de ambientalismo por apresentarem escores mais elevados em psicopatia (Mertens et al., 2021). Ademais, tais traços sombrios estão negativamente relacionados a uma orientação empreendedora sustentável (Wu et al., 2019), a pouca priorização de valores biosféricos (e.g., priorizar o respeito à terra e a harmonia entre as espécies) e, consequentemente, não agindo em prol do meio ambiente (Ucar et al., 2023). Logo, observa-se que a falta de empatia, frieza emocional e tendência para explorar os demais em benefício próprio, que caracterizam o núcleo da tríade sombria da personalidade, podem ter um papel importante para o entendimento de comportamentos e atitudes em relação ao meio ambiente. Cabe ressaltar que a personalidade é uma variável distal em relação ao comportamento, havendo variáveis mais proximais ao ambientalismo que podem atuar como mediadores, a exemplo das atitudes socioideológicas (Milfont, 2021).
Especificamente, a Orientação à Dominância Social (ODS) é uma atitude socioideológica que descreve a extensão na qual um indivíduo aprova a ideia de uma sociedade hierarquizada e apoia as desigualdades sociais (Ho et al., 2015). A ODS se estende para além das relações sociais, sendo também uma barreira ideológica para o engajamento ambiental (Stanley et al., 2021). Pessoas com elevados níveis de ODS se veem hierarquicamente superiores ao meio ambiente, legitimando mitos sobre a dominação do homem sobre a natureza (Milfont et al., 2017), o que asseguraria a manutenção das hierarquias sociais, garantindo que grupos de maior status explorem e utilizem os recursos naturais, relegando aos grupos com status mais baixo as consequências dos desastres ambientais (Milfont & Sibley, 2014). Portanto, pessoas com elevada ODS usam o ambiente como um meio para manter a hierarquia e perpetuar as desigualdades sociais (Stanley et al., 2021), indicando que esta é uma variável central para entender ações e atitudes em relação ao meio ambiente, sendo uma ligação entre a personalidade sombria e o ambientalismo.
A ODS é uma atitude voltada para a competição, expressando valores como dominação, poder e superioridade, envolvendo uma percepção do mundo como uma selva competitiva (Duckitt, 2001; Duckitt & Sibley, 2016). Essa atitude socioideológica é relativamente estável e predita por certos traços básicos da personalidade, a exemplo dos traços que formam a Tríade Sombria (Lee et al., 2013; Perry & Sibley, 2012). Os traços sombrios se desenvolvem em resposta a um contexto com elevada competitividade e recursos escassos, sendo que características como manipulação, egoísmo e comportamento explorador, podem ser vantajosos, facilitando a obtenção de recursos em contextos restritos (Jonason et al., 2019). Portanto, a ODS seria um mecanismo que levaria pessoas com traços sombrios da personalidade a ter pouca preocupação com o meio ambiente, explorando-o em benefício próprio.
Considerando o previamente indicado, o presente estudo objetiva verificar o papel mediador da ODS na relação entre o núcleo da tríade sombria da personalidade e o ambientalismo. Hipotetiza-se que o núcleo da tríade sombria predirá indiretamente o ambientalismo, fazendo-o por meio da orientação à dominância, que cumprirá o papel de preditor direto.
Método
Participantes
Participaram 305 pessoas com idades variando entre 18 e 77 anos (M idade = 26,4; DP idade = 11,25). Ademais, os participantes foram em maioria do sexo feminino (59,7 %) que se autodeclararam solteiros (78,4 %), brancos (51,8 %), de classe social média (46,6 %) e com ensino superior incompleto (61,6 %). Detalhes sobre o perfil sociodemográfico da amostra se encontram na Tabela 1.
Em relação ao tamanho da amostra, utilizou-se a calculadora online de Soper (2023) para estimar o número mínimo da amostra necessária para testar o modelo via Modelagem por Equações Estruturais. No caso, considerando que o modelo possui três variáveis latentes e 11 variáveis observadas, estimou-se o número mínimo de participantes para se obter um poder de 0,80, um tamanho de efeito grande (> 0,5) e um alfa igual ou menor do que 0,05. Os resultados indicaram que o mínimo de amostra recomendada seria de 123 participantes, logo, os 305 participantes do presente estudo são suficientes para a realização das análises planejadas.
Instrumentos
New Ecological Paradigm Scale (NEP; Dunlap et al., 2000). Medida adaptada para o Brasil por Pires et al. (2016), é composto por 15 itens (ω = 0,70) que avaliam o grau de endosso em relação a uma visão de mundo ecológica. Os participantes são orientados a indicar em uma escala de cinco pontos (1: Discordo Fortemente; 5: Concordo Fortemente) o quanto os itens o descrevem, a exemplo de “Quando humanos interferem na natureza, isso frequentemente produz consequências desastrosas” e “Plantas e animais têm o mesmo direito de existir que humanos”. Ademais, foram incluídos dois itens relacionados a atitudes frente a mudança climática: “A mudança climática é real” e “A mudança climática é causada pelos seres humanos”.
Two Dimensional MACH-IV (TDM-IV; Monaghan et al., 2016). Medida adaptada para o Brasil por Monteiro et al. (2022), formada por 10 itens que avaliam tanto visões (ω = 0,59) quanto táticas (ω = 0,74) maquiavélicas. Os participantes são orientados a indicar o seu nível de concordância (1: Discordo Fortemente; 5: Concordo Fortemente) a itens como “Quem confia completamente em alguém está pedindo para ter problemas” e “É difícil ter sucesso sem pegar atalhos”.
Narcissistic Personality Inventory-13 (NPI-13; Gentile et al., 2013). Os itens desta medida foram traduzidos por Monteiro (2017), sendo que esta versão da NPI é formada por 13 itens (ω = 0,81), tendo como objetivo mensurar o nível de narcisismo dos indivíduos. Os participantes são orientados a indicar a sua concordância (1: Discordo Fortemente; 5: Concordo Fortemente) a itens como “Eu gosto de me olhar no espelho” e “Usualmente tento me exibir quando tenho a oportunidade”.
Levenson Self-Report Psychopathy (Levenson et al., 1995). Medida adaptada para o Brasil por Hauck-Filho e Teixeira (2014), sendo formada por 26 itens (ω = 0,82), os quais são respondidos em escala de quatro pontos, sendo os participantes orientados a indicar a sua concordância (1: Discordo Totalmente; 4: Concordo Totalmente) a itens como “Fazer dinheiro é minha meta mais importante” e “Eu não planejo nada com muita antecedência”.
Big Five Inventory-20 (Veloso Gouveia et al., 2021). Esse instrumento é formado por 20 itens, tendo como objetivo captar a autopercepção do indivíduo sobre os cinco grandes fatores de personalidade. No caso, os participantes devem indicar em que medida concordam (1: Discordo Totalmente; 5: Concordo Totalmente) com cada item descrevendo a sua personalidade, a exemplo de “Gosta de cooperar com os outros” (Amabilidade; ω = 0,70), “É temperamental, muda de humor com frequência” (Neuroticismo; ω = 0,77), “Gosta de refletir, brincar com as ideias” (Abertura; ω = 0,75), “Gera muito entusiasmo” (Extroversão; ω = 0,81) e “Faz as coisas com eficiência” (Conscienciosidade; ω = 0,74).
Social Dominance Orientation 7 Scale (SDO7; Ho et al., 2015). Adaptada para o Brasil por Vilanova et al. (2022), sendo formada por 16 itens (ω = 0,89), aos quais os participantes devem indicar seu nível de concordância (1: Discordo Fortemente; 7: Concordo Fortemente) a itens como “Nenhum grupo deveria dominar na sociedade” e “Alguns grupos são simplesmente inferiores aos outros”.
Procedimento
Os dados foram coletados por meio de um questionário online utilizando-se do procedimento de amostragem bola de neve, sendo o link da pesquisa divulgado nas redes sociais. Prévio ao preenchimento dos instrumentos, os participantes deveriam ler e concordar com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, no qual eram informados sobre os objetivos do estudo, o caráter anônimo e voluntário da participação e que poderiam declinar da pesquisa a qualquer momento, sem acarretar prejuízos. Assevera-se que o presente estudo seguiu a Resolução 510/16, que orienta as pesquisas nas ciências humanas e sociais, tendo parecer favorável do comitê de ética em pesquisa (CAAE 31360920.1.0000.5181).
Análise de dados
Os dados foram tabulados e analisados por meio do SPSS e AMOS. Com o primeiro, foram calculadas análises descritivas (média, desvio padrão) e inferenciais, especificamente análise de correlação de Pearson para conhecer o padrão geral de associação entre as variáveis. Com o segundo software, foi realizada uma Modelagem por Equações Estruturais (estimador Maximum Likelihood), testando um modelo mediacional. Para atestar a qualidade do modelo, tiveram-se em conta os seguintes indicadores de ajuste do modelo aos dados (entre parênteses valores para um modelo aceitável Hair et al., 2015): χ²/gl, Comparative Fit Index (acima de 0,90), Tucker-Lewis Index (acima de 0,90) e Root Mean Error of Approximation (abaixo de 0,08).
Resultados
Inicialmente, foram calculadas análises de correlação de Pearson para conhecer o padrão geral de relação entre as variáveis. No caso, entre os oito traços de personalidade, apenas a psicopatia (r = -0,17; p < 0,01) se correlacionou de forma significativa com o ambientalismo (cômputo da NEP e dos itens sobre mudança climática). Verificou-se, ainda, que a ODS apresentou correlação moderada com o ambientalismo (r = -0,53; p < 0,001). Na Tabela 2 é possível observar em mais detalhes as relações entre todas as variáveis.
Nota: Identificação das variáveis: Amb: Ambientalismo; ODS: Orientação à Dominância Social; M: Maquiavelismo; N: Narcisismo; P: Psicopatia; EX: Extroversão; CO: Conscienciosidade; AM: Amabilidade; AB: Abertura; NE: Neuroticismo. *p < 0,05; **p < 0,001 (teste unicaudal)
O passo seguinte foi testar os efeitos diretos e indiretos dos traços sombrios de personalidade e das atitudes socioideológicas para a predição do ambientalismo (Figura 1). Considerando que os três traços sombrios têm em comum uma tendência para a manipulação, insensibilidade e comportamento explorador, modelou-se uma variável latente tendo os três traços como variáveis observáveis, formando assim o núcleo da personalidade sombria, predizendo a orientação à dominância, modelada por meio de duas variáveis observadas (Dominância e Anti-igualitarismo), explicando diretamente o Ambientalismo, modelada pelas cinco facetas da escala NEP, mais dois itens avaliando atitudes em relação à mudança climática. Cabe ressaltar que o modelo CGF foi considerado na presente pesquisa para efeitos de controle, contudo, nenhum dos traços deste modelo se correlacionou com o ambientalismo, optamos por não o incluir na testagem do modelo.
Por meio de bootstrap com 5.000 reamostragens, verificaram-se inicialmente efeitos diretos da personalidade sombria no ambientalismo (λ = -0,22; IC90% = -0,33/-0,10, p < 0,05). Após a inserção da ODS como mediadora, verificaram-se efeitos indiretos dos traços sombrios no ambientalismo (λ = -0,25; IC90% = -0,36/-0,17, p < 0,001), sendo essa mediação completa, posto que os efeitos diretos da personalidade sombria no ambientalismo deixaram de ser estatisticamente significativos (λ = 0,03, IC 90% = -0,08/0,16, p = 0,65) com a inclusão da ODS, que predisse diretamente o desfecho (λ = 0,36, IC 90% = 0,25/0,48, p < 0,001). Finalmente, o modelo testado apresentou indicadores de ajuste aceitáveis (χ²/gl = 1,87, CFI = 0,95, TLI = 0,93, RMSEA = 0,054).
Discussão
O problema das mudanças climáticas e das ações antiambientais no Brasil é uma questão ainda em aberto. O país ainda possui pouco tratamento de esgoto, além de ter parte de sua rica biodiversidade seriamente ameaçada por conta da ação humana (Feng et al., 2021; Tomas et al., 2021). Compreender as bases sociopsicológicas dos comportamentos e atitudes em relação ao meio ambiente é crucial, de modo que a diminuição dos problemas ambientais perpassa por mudanças a nível individual (Zelezny & Schultz, 2000). No presente estudo, aportamos com evidências acerca da influência direta de atitudes socioideológicas e indiretas do núcleo da tríade sombria da personalidade sobre o ambientalismo.
Apesar do enfoque que a literatura dá ao modelo CGF (Hirsh & Dolderman; 2007; Milfont & Sibley, 2012), observou-se que nenhum dos cinco fatores se relacionou com o ambientalismo. Por outro lado, no modelo de regressão, verificou-se o efeito direto do núcleo da tríade sombria de personalidade na predição do ambientalismo, o que sugere que traços aversivos da personalidade são prejudiciais não apenas nas relações interpessoais, mas também para as relações pessoa-ambiente. A propósito, tais evidências somam-se a dados prévios da literatura (Huang et al., 2018; Ucar et al., 2023; Wu et al., 2019), denotando que pessoas com traços sombrios não se preocupam com o meio-ambiente, explorando-o em benefício próprio sem se preocupar com sua reposição/preservação. Os traços que formam o lado sombrio da personalidade humana apresentam em comum baixos níveis de amabilidade (Gouveia et al., 2016) e honestidade/humildade (Book et al., 2015), além de déficits empáticos (Wai & Tiliopoulos, 2012), sendo que esses aspectos compartilhados são preditores do ambientalismo (Hirsh & Dolderman; 2007; Milfont & Sibley, 2012, 2016).
Portanto, em razão dos aspectos que caracterizam o núcleo da tríade sombria da personalidade, percebe-se que pessoas com elevados níveis nesse agrupamento de traços não conseguem se preocupar com o ambiente natural e com os outros animais. Questões relativas à preservação do meio ambiente são vistas como sem importância por pessoas com escores elevados no núcleo da tríade sombria (Ucar et al., 2023). Não obstante, cabe ressaltar que a magnitude das relações entre personalidade e ambientalismo é menor em comparação as atitudes socioideológicas em razão da natureza distal da personalidade. A propósito, quando a ODS é incluída no modelo, a personalidade sombria deixa de predizer diretamente o ambientalismo, tendo efeitos indiretos, atestando a mediação completa da ODS, confirmando o papel que esta variável tem como preditor direto do ambientalismo, em linha com estudos prévios (Milfont et al., 2017; Stanley et al., 2021).
Nesse ponto, cabe destacar que a ODS funciona como um mecanismo que possibilita pessoas com personalidade sombria a adotar atitudes e comportamentos antiambientais. No caso, os traços sombrios são úteis em contextos de escassez e alta competitividade, tornando o indivíduo mais apto a extrair recursos em contextos restritos (Jonason et al., 2019). Isso leva pessoas com esse perfil de personalidade a terem uma maior orientação à dominância social, caracterizada como uma atitude socioideológica que envolve a percepção do mundo como uma selva competitiva, expressando valores como dominação, poder e superioridade (Duckitt, 2001; Duckitt & Sibley, 2016), resultando em menores níveis de ambientalismo, vendo-se superior a natureza e no direito de dominá-la e utilizá-la em benefício próprio (Milfont et al., 2013; Milfont & Sibley, 2014).
Percebe-se que a ODS funcionaria como um mecanismo que possibilitaria pessoas com traços sombrios dominarem a natureza e a explorarem para a obtenção de recursos. Cabe ressaltar, ainda, que por se enxergarem como superiores a natureza, aliado a serem extremamente individualistas (Paulhus & Williams, 2002), pessoas com traços sombrios optam por não modificarem sua rotina diária (e.g., economizar água e energia, reduzir o uso dos veículos) em prol do meio ambiente.
Apesar dos resultados promissores, é importante analisá-los com cautela. Algumas limitações do estudo são a amostra não probabilística, formada majoritariamente por universitários, além da desejabilidade social. Em estudos futuros é importante contar com amostras maiores e mais heterogêneas (e.g., distribuição mais equitativa em relação ao nível de escolaridade, etnia e classe socioeconômica), além de testar o papel de outros traços aversivos da personalidade (e.g., sadismo, ganância, despeito) e utilizar medidas comportamentais para aferir o comportamento pró/antiambiental. Portanto, percebe-se que as possibilidades de estudo não se esgotam aqui, havendo uma ampla possibilidade de pesquisas para predizer comportamentos e atitudes em relação ao meio ambiente e, a partir do mapeamento dos preditores, propor estratégias de intervenção visando a promoção do ambientalismo.