SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18 número1Apoyo institucional y acciones antituberculosas en Atención Primaria de Salud en Brasil*Salud en cárceles del Uruguay. Reflexiones y propuestas de intervención en gestión y política sanitaria índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Links relacionados

Compartir


Revista Uruguaya de Enfermería (En línea)

versión impresa ISSN 2301-0371versión On-line ISSN 2301-0371

Revista urug. enferm. (En línea) vol.18 no.1 Montevideo  2023  Epub 01-Jun-2023

https://doi.org/10.33517/rue2023v18n1a8 

Investigación

Análise da internação e mortalidade por HIV no Brasil, 2016-2020

Análisis de la hospitalización y la mortalidad por VIH en Brasil, 2016-2020

Analysis of Hospitalization and HIV Mortality in Brazil, 2016-2020

Gabriel Pavinati1 
http://orcid.org/0000-0002-0289-8219

Lucas Vinícius de Lima2 
http://orcid.org/0000-0002-9582-9641

Leticia Rafaelle de Souza Monteiro3 
http://orcid.org/0000-0002-2067-952X

Isadora Gabriella Paschoalloto da Silva4 
http://orcid.org/0000-0003-2542-1488

Gabriela Tavares Magnabosco5 
http://orcid.org/0000-0003-3318-6748

1Enfermeiro. Mestrando em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Paraná, Brasil. Contato: gabrielpavinati00@gmail.com.

2Enfermeiro. Mestrando em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Paraná, Brasil. Contato: lvl.vinicius@gmail.com.

3Enfermeira. Mestranda em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Paraná, Brasil. Contato: le.rafaelle12@gmail.com.

4Enfermeira. Doutoranda em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Paraná, Brasil. Contato: isaagabriella@gmail.com.

5Enfermeira. Doutora em Ciências. Docente da Universidade Estadual de Maringá, Paraná, Brasil. Contato: gtmagnabosco@uem.br.


Resumo:

Apesar dos avanços programáticos conquistados na atenção às pessoas que vivem com HIV no Brasil, os índices de morbimortalidade atribuídos à infecção ainda são altos e heterogêneos no território nacional. Destarte, entende-se que os aspectos epidemiológicos do HIV devam ser analisados em consonância com as características e delimitações geográficas. Este estudo objetivou analisar os coeficientes de internação hospitalar e de mortalidade por HIV, segundo regiões do Brasil, de 2016 a 2020. Tratou-se de um estudo ecológico das regiões brasileiras, com dados extraídos das plataformas públicas de informação, referentes ao período de 2016 a 2020. Procedeu-se a análise por meio de estatística descritiva e, baseado nos coeficientes regionais de internação hospitalar e mortalidade calculados, foram derivadas ilustrações geográficas por meio do software QGIS, a partir do mapa do Brasil, divisado por regiões. Os resultados apontaram que as internações por HIV apresentaram queda em todas as regiões ao longo do período, contudo, o Sudeste se manteve abaixo da média nacional. Com relação aos óbitos, a queda foi observada em todas as regiões, com menor variação no Nordeste e Norte. Ademais, as regiões Sul e Norte seguiram com os maiores coeficientes de mortalidade do país durante todo o período analisado, enquanto as demais ficaram abaixo da média nacional. Pontua-se a necessidade de novas investigações quanto às especificidades regionais de conformação e organização da rede de atenção no que se refere à oferta de ações e serviços de saúde, bem como das condições socioeconômicas e comportamentais que influem no curso da infecção pelo HIV.

Palavras-chave: indicadores de morbimortalidade; hospitalização; mortalidade; HIV; epidemiologia

Resumen:

A pesar de los avances programáticos alcanzados en la atención de las personas que viven con el VIH en Brasil, las tasas de morbilidad y mortalidad atribuidas a la infección aún son elevadas y heterogéneas en el territorio nacional. Así, se entiende que los aspectos epidemiológicos del VIH deben ser analizados de acuerdo con las características y límites geográficos. Este estudio tuvo como objetivo analizar los coeficientes de hospitalización y mortalidad por VIH, según regiones de Brasil, de 2016 a 2020. Se trata de un estudio ecológico de regiones brasileñas, con datos extraídos de plataformas de información pública, referentes al período de 2016 a 2020. El análisis se realizó mediante estadística descriptiva y, a partir de los coeficientes de ingreso hospitalario regional y mortalidad calculados, se derivaron ilustraciones geográficas utilizando el software QGIS, a partir del mapa de Brasil, dividido por regiones. Los resultados mostraron que las hospitalizaciones por VIH disminuyeron en todas las regiones en el período, sin embargo, el Sudeste se mantuvo por debajo del promedio nacional. En cuanto a las muertes, la caída se observó en todas las regiones, con menor variación en el Nordeste y Norte. Además, las regiones Sur y Norte continuaron presentando las tasas de mortalidad más altas del país durante todo el período analizado, mientras que las demás se ubicaron por debajo del promedio nacional. Existe la necesidad de mayores investigaciones sobre las especificidades regionales de conformación y organización de la red de atención en lo que se refiere a la provisión de acciones y servicios de salud, así como las condiciones socioeconómicas y conductuales que influyen en el curso de la infección por el VIH.

Palabras clave: indicadores de morbimortalidad; hospitalización; mortalidad; VIH; epidemiología

Abstract:

Despite the programmatic advances achieved in the care of people living with HIV in Brazil, the morbidity and mortality rates attributed to the infection are still high and heterogeneous in the national territory. Thus, it is understood that the epidemiological aspects of HIV should be analyzed in accordance with the characteristics and geographical boundaries. This study aimed to analyze the coefficients of hospitalization and mortality from HIV, according to regions of Brazil, from 2016 to 2020. This was an ecological study of Brazilian regions, with data extracted from public information platforms, referring to the period 2016 to 2020. The analysis was performed using descriptive statistics and, based on the calculated regional hospital admission and mortality coefficients, geographic illustrations were derived using the QGIS software, from the map of Brazil, divided by regions. The results showed that hospitalizations for HIV decreased in all regions over the period; however, the Southeast remained below the national average. Regarding deaths, the drop was observed in all regions, with less variation in the Northeast and North. Furthermore, the South and North regions continued to have the highest mortality rates in the country throughout the analyzed period, while the others were below the national average. There is a need for further investigations regarding the regional specificities of conformation and organization of the care network with regard to the provision of health actions and services, as well as the socioeconomic and behavioral conditions that influence the course of HIV infection.

Keywords: Indicators of Morbidity and Mortality; Hospitalization; Mortality; HIV; Epidemiology

Introdução

Nos últimos 14 anos, o Brasil registrou mais de 380 mil casos de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), concentrados principalmente nas regiões Sudeste (43,3%), Nordeste (19,8%) e Sul (19,7%)1. Para o controle eficiente da infecção, de caráter crônico, demanda-se dos serviços de saúde ações de cuidado contínuas, proativas e integradas2.

No âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), é estabelecida a oferta de atenção continuada para as pessoas que vivem com HIV (PVHIV), a qual ocorre por meio de um processo envolvendo diagnóstico oportuno, vinculação do indivíduo a um serviço, retenção no seguimento, início da terapia antirretroviral (TARV), supressão da carga viral e alcance de melhor qualidade de vida3)(4.

Apesar dos avanços programáticos conquistados na atenção às PVHIV, os índices de morbimortalidade ainda são altos5)(6. No Brasil, só em 2019, foram registrados mais de dez mil óbitos tendo a Aids como causa básica1. Esse cenário corresponde a uma complexa problemática que requer investigação e planejamento, visando estratégias para sua superação7.

Existem inúmeros desafios de ordem moral, ética, técnica, organizacional e política a serem superados no sentido da aplicação do acesso e aperfeiçoamento da qualidade do cuidado às PVHIV8. Para isso, enfatiza-se o fortalecimento das políticas de oferta universal da TARV, métodos de prevenção combinada e ampliação da testagem precoce no âmbito do SUS9).

Em anos recentes, a proposta programática para o manejo do HIV na Rede de Atenção à Saúde (RAS), pressupõe que o cuidado deve ser compartilhado entre Atenção Primária à Saúde (APS) e atenção especializada8. Contudo, esse modelo ainda não está plenamente consolidado no Brasil, suscitando o enfrentamento dessa problemática como meio para ampliar o acesso e a qualidade do cuidado às PVHIV8.

Entretanto, países com numeroso quantitativo populacional e proporções continentais, como o Brasil, enfrentam grande disparidade social, com recursos de saúde deficitários e desigualmente distribuídos10. Sendo assim, o país enfrenta um desafio ainda maior no âmbito da saúde pública e controle do HIV, uma vez que o fator geográfico surge como possível dificultador do acesso das PVHIV aos serviços e ações de saúde, bem como a continuidade do cuidado pela vinculação do usuário à rede de atenção.

Nessa perspectiva, entende-se que os aspectos epidemiológicos das condições de saúde devem ser avaliados em consonância com as características, delimitações geográficas e conformação da rede de atenção, sobretudo em países nos quais a qualidade da oferta de ações e serviços pode ser afetada por questões socioeconômicas de suas regiões. Destarte, o presente estudo se propôs a analisar os coeficientes de internação hospitalar e de mortalidade por HIV, segundo regiões do Brasil, de 2016 a 2020.

Métodos

Estudo ecológico das regiões brasileiras, com dados extraídos das plataformas digitais: Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM/SUS) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), disponibilizadas pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) do Ministério da Saúde. Para este estudo, foram considerados os dados registrados no período de 2016 a 2020.

O sim e o SIH são sistemas públicos e congregam dados derivados das notificações realizadas pelos serviços de saúde nacionais, portanto, são importantes fontes de dados sobre mortalidade e morbidade, cujo objeto de registro corresponde ao óbito e à internação vinculados aos serviços do SUS. O desenvolvimento e a aplicabilidade dos sistemas acompanham o modelo organizativo-assistencial da RAS, fundamentando o elo entre vigilância epidemiológica e planejamento do cuidado para o controle de agravos e atendimento às necessidades individuais e populacionais.

Com relação ao universo dos dados relativos às internações hospitalares, foram analisadas as internações de acordo com local da residência, por região do Brasil, a partir das categorias da lista de morbidade da 10ª edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), a saber: Doença pelo vírus da imunodeficiência humana e Estado de infecção assintomática pelo vírus da imunodeficiência humana.

No que tange a mortalidade, consideraram-se os óbitos por residência, segundo região, considerando o grupo da CID-10: Doença pelo vírus da imunodeficiência humana. Para o quantitativo populacional nas regiões, utilizou-se a estimativa populacional intercensitária do Ibge (2000-2021). A coleta e a análise dos dados ocorreram na primeira quinzena de maio de 2022.

Os dados foram exportados para o software MICROSOFT EXCEL 2016, no qual se procedeu a análise por meio de estatística descritiva. Para o cálculo das freqüências relativas, ancorou-se na distribuição das freqüências absolutas das internações hospitalares e mortalidade. O cálculo dos coeficientes de internação hospitalar se deu pela razão entre o número de internações e a estimativa da população geral, no mesmo período e região, e o resultado multiplicado por 100 mil.

Do mesmo modo, para os coeficientes de mortalidade, calculou-se a razão entre o número de óbitos e a estimativa da população geral, no mesmo período e região, e o resultado multiplicado por 100 mil. Com os coeficientes regionais, calculou-se a média aritmética para o país. Para estimar a variação percentual (VAR) entre o início e o final da série histórica, a partir dos valores dos coeficientes do primeiro e do último ano considerados, empregou-se a expressão:

Baseado nos coeficientes de internação hospitalar e mortalidade para cada região nos anos de 2016 e 2020, foram derivadas ilustrações geográficas por meio do software QGIS, versão 3.24, a partir de arquivo shapefile do mapa do Brasil, divisado por regiões geográficas do país (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste), atualizado e acessado em maio de 2022 no site do IBGE.

A distribuição espacial de cada ano se deu pela classificação intervalar manual entre os coeficientes de internação e mortalidade, de modo a visualizar a diferença entre os coeficientes dos anos supracitados. Foram atribuídas cores frias em uma escala de diferentes tons, de modo que os mais escuros corresponderam às maiores taxas e os mais claros representaram as menores.

Por se tratar de dados secundários de domínio público, agregados e não nominais, este trabalho dispensou apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, conforme preconizado pela Resolução n.º 510/2016, do Conselho Nacional de Saúde. Entretanto, cumpre ressaltar que foram respeitadas as normas e diretrizes da legislação brasileira vigente.

Resultados

No período analisado, de 2016 a 2020, foram registradas 144.671 internações hospitalares por HIV no Brasil. A distribuição pelas regiões se deu da seguinte forma: 44.649 (30,9 %) no Sudeste, 43.909 (30,3 %) no Nordeste, 28.670 (19,8 %) no Sul, 15.024 (10,4 %) no Norte e 12.419 (8,6 %) no Centro-Oeste. Com relação à mortalidade, houve 56.850 mortes, distribuídas nas regiões da seguinte maneira: 23.146 (40,7 %) no Sudeste, 12.779 (22,5 %) no Nordeste, 10.954 (19,3 %) no Sul, 6.152 (10,8 %) no Norte e 3.819 (6,7 %) no Centro-Oeste.

Os coeficientes de internação entre 2016 e 2019 se mostraram, praticamente, estacionários ano a ano. Entretanto, quando comparados os coeficientes de internação de 2016 a 2020, foi observada redução em todas as regiões, especialmente entre os dois últimos anos, 2019 e 2020. A variação entre 2016 e 2020 mostrou maior queda na região Sudeste (-49,2 %), seguida do Sul (-45,4 %), Centro-Oeste (-32 %), Nordeste (-30 %) e Norte (-21 %), conforme Tabela 1. A região Sudeste foi a única que se manteve abaixo da média em todo o período, como demonstra a Figura 1.

Tabela 1: Coeficientes de internação hospitalar por HIV, a cada 100.000 habitantes, segundo regiões do Brasil, de 2016 a 2020 

Fonte:SIH/SUS.

Figura 1: Série histórica dos coeficientes de internação hospitalar por HIV, segundo regiões do Brasil, de 2016 a 2020 

Os coeficientes de mortalidade entre 2017 e 2019 se mostraram, sugestivamente, estáveis ao longo dos anos. Todavia, quando comparados os anos de 2016 e 2020, observou-se queda em todas as regiões. A variação entre 2016 e 2020 mostrou que a maior queda foi no Centro-Oeste (-22,1%), seguido do Sudeste (-21,6%), Sul (-21,5%), Norte (-10,1%) e Nordeste (-8,5%), conforme Tabela 2. As regiões Nordeste e Centro-Oeste ficaram abaixo da média nacional durante todo o período, englobando a região Sudeste a partir de 2017, como observado na Figura 2.

Tabela 2: Coeficientes de mortalidade por HIV, a cada 100.000 habitantes, segundo regiões do Brasil, de 2016 a 2020 

Fonte: SIM/SUS.

Figura 2: Série histórica dos coeficientes de mortalidade por HIV, segundo regiões do Brasil, de 2016 a 2020 

Em 2016, os maiores coeficientes de internação e mortalidade foram notados na região Sul, seguida da região Norte. Na comparação entre o primeiro e o último ano da série, 2016 e 2020, respectivamente, percebeu-se diminuição do coeficiente de internação hospitalar nas regiões Norte, Nordeste, Sul e Centro-Oeste. Ademais, com relação ao coeficiente de mortalidade, verificou-se queda nas regiões Norte, Sul e Centro-Oeste, conforme Figura 3.

Figura 3: Distribuição espacial dos coeficientes de internação hospitalar e mortalidade por HIV, segundo regiões do Brasil, na comparação 2016 e 2020 

Discussão

Os resultados apontaram que as internações hospitalares por HIV tiveram queda em todas regiões do país no período analisado, em especial na comparação 2019 e 2020, em que houve maior queda. O acesso ao tratamento adequado contribuiu grandemente para a melhora da sobrevida e, consequentemente, para a redução da morbimortalidade por HIV11)(12)(13. O acesso ao diagnóstico e tratamento precoce, a vinculação do indivíduo ao serviço de saúde e o envolvimento familiar são fundamentais para o cuidado holístico e essencial para a garantia da qualidade de vida dos indivíduos14.

A despeito das políticas de prevenção e manejo do agravo implementadas ao longo das últimas décadas, a crise social e econômica pela qual o país passa desde 2014, acrescida ao advento da pandemia da covid-19desde 2020, faz com que os serviços de saúde sofram uma sobrecarga e sérias instabilidades, obstaculizando o acesso e a continuidade do cuidado15.

Especificamente quanto à covid-19, diversas foram as repercussões na oferta de ações e serviços de saúde, em especial às estratégias direcionadas às PVHIV, tais como: dificuldade no acesso e vinculação16, redução dos recursos humanos e materiais17, sobrecarga dos profissionais que atuam nos serviços assistenciais e de vigilância em saúde, entre outros18.

Assim, a queda de internações evidenciada no período analisado pode estar associada à essas dificuldades, desvelando uma situação desfavorável com relação à implementação de ações de controle do HIV. Tais efeitos ameaçam o progresso do controle do HIV conquistado nas últimas décadas16, servindo como alerta para as autoridades sanitárias.

Aponta-se que vulnerabilidades individuais, sociais e programáticas figuram como fatores que determinam a agudização da infecção e consequentemente, a necessidade de internação19, vislumbrando, nesse cenário, a urgência de ampliação do acesso e qualidade do cuidado às PVHIV8, em especial nas regiões com maior proporção de internações hospitalares.

Nesse contexto, no que se refere à organização da rede de atenção ao HIV com centros e serviços especializados, sinaliza-se o papel fundamental que APS vem exercendo no cuidado às PVHIV no Brasil, responsabilizando-se pela ampliação das ações de promoção, prevenção, diagnóstico e pelo acompanhamento das desses indivíduos8, com o potencial de minimizar os efeitos da agudização por falta de cuidado contínuo e proximal e que podem culminar no agravamento da condição e posterior necessidade de internação.

Quando comparadas as variações percentuais de 2016 e 2020, as regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul apresentaram os maiores decréscimos nos coeficientes de mortalidade, ao passo que as regiões Nordeste e Norte apresentaram as menores quedas, respectivamente. Esses achados estão em consonância com um estudo que analisou a tendência das taxas de mortalidade no Brasil, por HIV, no qual o Sul, Sudeste e Centro-Oeste apresentaram redução ou estabilidade, enquanto o Norte e Nordeste apresentaram variações crescentes7, podendo esse cenário estará trelado aos indicadores de saúde, educação e renda nessas regiões20.

Associado a isso, evidencia-se a fragilidade da assistência às PVHIV nas regiões Norte e Nordeste, que possui forte dependência dos serviços de alta complexidade posicionados nos grandes centros urbanos dessas regiões21)(22)(23, situação que pode prejudicar o acesso, uma vez que obstaculiza a busca pelo serviço pelas pessoas que residem em locais mais distantes das capitais.

Nessa configuração, infere-se que a APS pode não estar assumindo a coordenação do cuidado e se apresenta pouco qualificada e estruturada para o acompanhamento das PVHIV, operando com excesso de encaminhamentos, na contramão do preconizado pelos órgãos federais, e negligenciando o cuidado, que passa a ser centralizado21. Reforçando essa hipótese, estudo realizado no Nordeste mostrou que os profissionais de saúde locais ainda carecem de qualificação voltada para o atendimento a esse público24.

Diante do observado, é imperativa a garantia da continuidade dos serviços e ações voltadas a esse público no país como um todo, sobretudo frente à situação de sindemia vigente6. De acordo com Singer (1996, p. 99), “sindemia é um conjunto de problemas de saúde intimamente interligados e que aumentam mutuamente, que afetam significativamente o estado geral de saúde de uma população no contexto de persistência de condições sociais adversas”25.

Trata-se, portanto, do entrosamento entre doenças e contexto social vivenciado, que, ao se somarem, acentuam os malefícios em relação à ocorrência isolada desses mesmos fenômenos. Assim, é importante frisar que a pandemia da COVID-19 pode acentuar as dificuldades já enfrentadas, configurando-se como mais um fator prejudicial ao acesso e continuidade do cuidado às PVHIV, sobretudo devido aos efeitos deletérios aos serviços de saúde que atendem essa população26, sendo as repercussões a longo prazo ainda incertas, mas potencialmente catastróficas.

Por conseguinte, aponta-se a urgência de descentralização das ações de manejo e controle do HIV aos serviços da APS, sempre que possível, de modo que essa (re)organização permita à população o acesso às ações de prevenção e promoção em saúde desenvolvidas localmente12, a partir das reais necessidades e demandas dos indivíduos acometidos19.

O acesso ao diagnóstico e tratamento, bem como a adesão à TARV, podem ter especificidades regionais11.Desse modo a compreensão das particularidades e singularidades territoriais, individuais e coletivas, é fundamental para o enfrentamento do fenômeno, visando ações de saúde que articulem os diversos setores sociais em prol da transformação da realidade das PVHIV11)(12.

Este trabalho possibilitou a compreensão de aspectos inerentes à infecção pelo HIV para além dos números, entendendo o caráter histórico e dinâmico do agravo ao longo dos anos em cada região do país. Vislumbra-se a potencialidade dos dados derivados dos sistemas públicos de informação enquanto fonte para a produção do conhecimento no âmbito da vigilância epidemiológica, sendo capaz de subsidiar o desenvolvimento de políticas públicas em saúde a partir de achados científicos.

Todavia, ressalta-se que ainda existem desafios no que se refere à notificação das ocorrências de maneira correta, em tempo oportuno e integrada nas diversas fontes. Estudo realizado por linkage entre o SIH/SUS e o SIM/SUS demonstrou subnotificação dos óbitos por AIDS no Brasil, um alerta para necessidade de ações que visem registros corretos para subsidiar a vigilância, o planejamento e qualificação dos serviços27.

Frente a isso, reconhece-se que o uso de dados secundários pode ser considerado uma limitação do estudo, uma vez que erros podem ser cometidos no preenchimento das notificações e que há a possibilidade de subnotificação ou notificação por outras causas oportunistas decorrentes da infecção pelo HIV.

Conclusão

Evidenciou-se que, no cenário nacional, as internações por HIV apresentaram queda em todas as regiões ao longo do período, contudo, o Sudeste se manteve abaixo da média nacional. Salienta-se que, em 2020, houve o maior decréscimo dos coeficientes de internação por HIV no país presumivelmente em decorrência da pandemia da COVID-19, apontando a necessidade de investigação para melhor compreensão do achado.

Com relação aos óbitos, a queda dos coeficientes foi observada em todas as regiões, com menor variação no Nordeste e Norte, respectivamente. Ademais, as regiões Sul e Norte seguiram com os maiores coeficientes do país durante todo o período analisado, enquanto as demais ficaram abaixo da média nacional.

Nesse cenário, vislumbra-se a necessidade do direcionamento de estratégias que visam o enfrentamento da situação sanitária, em especial nas regiões com os maiores indicadores de hospitalização e mortalidade. Cumpre destacar a potencialidade da vigilância epidemiológica enquanto pedra angular para embasar as políticas de saúde em todas as esferas governamentais.

Sinala-se, também, o papel crucial da APS como ordenadora e articuladora do cuidado, na busca pela oferta da assistência integral, integrada e contínua, de forma compartilhada com outros serviços da rede de atenção e em maior proximidade à população. Nesse sentido, a capilaridade territorial da APS é sinequa non para a garantia do acesso universal aos serviços da RAS.

Pontua-se, ainda, a necessidade de novas investigações que melhor compreendam os aspectos intrínsecos às especificidades regionais de conformação e organização da rede de atenção no que se refere à oferta de ações e serviços de saúde, bem como das condições socioeconômicas e culturais que influem no curso da infecção pelo HIV.

Nessa lógica, espera-se, por meio do conhecimento do comportamento das internações e óbitos por HIV no país, estimular e subsidiar novos estudos voltados para a identificação das circunstâncias determinantes dessas situações, com intuito de qualificar o cuidado ofertado e o controle da infecção no Brasil.

Referências:

1. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis - DCCI.Boletim Epidemiológico HIV/AIDS. Ministério da Saúde.(Internet). Brasília (DF): MS; 2021 (citado maio 2022). Disponível em:Disponível em:http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2020/boletim-epidemiologico-hivaids-2020 . [ Links ]

2. Mendes, EV. Entrevista: a abordagem das condições crônicas pelo Sistema Único de Saúde. CienSaude Colet. (Internet). 2018(citado 24 maio 2022);23(2). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232018232.16152017. [ Links ]

3. Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/AIDS e das Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos. Ministério da Saúde. Brasília (DF): MS ;(Internet).2018 (citado em 2022 maio 25). Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2013/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-manejo-da-infeccao-pelo-hiv-em-adultos . [ Links ]

4. Lacerda JS, Paulo RG, Ayoama EA, Rodrigues GMM. Evolução medicamentosa do HIV no brasil desde o AZT até o coquetel disponibilizado pelo sistema único de saúde. Revista Brasileira Interdisciplinar de Saúde. (Internet).2019(citado 24 maio 2022);1(4):83-91. Disponível em: Disponível em: https://revistarebis.rebis.com.br/index.php/rebis/article/view/57 . [ Links ]

5. Burke RM, Henrion MYR, Mallewa J, Masamba L, Kalua T, Khundi M, Gupta-Wright A, Rylance J, Gordon SB, Masesa C, Corbett EL, Mwandumba HC, Macpherson P. Incidence of HIV-positive admission and inpatient mortality in Malawi (2012-2019). AIDS.(Internet).2021(citado 24 maio 2022);35(13):2191-2199. doi: 10.1097/QAD.0000000000003006. [ Links ]

6 - Paula AA, Pires DF, Alves Filho P, Lemos KRV, Veloso VG, Grinsztejn B, Pacheco AG. Perfis de mortalidade entre pessoas vivendo com HIV/aids: comparação entre o Rio de Janeiro e outras unidades da federação entre 1999 e 2015. Revbrasepidemiol. (Internet). 2020(citado 24 maio 2022);23. doi: 10.1590/1980-549720200017. [ Links ]

7. Cunha AP, Cruz MM, Pedroso M. Análise da tendência da mortalidade por HIV/AIDS segundo características sociodemográficas no Brasil, 2000 a 2018. Ciênc saúde coletiva. (Internet).2022(citado 24 maio 2022);27(03). doi: 10.1590/1413-81232022273.00432021. [ Links ]

8. Melo EA, Maksud I, Agostini R. Cuidado, HIV/Aids e atenção primária no Brasil: desafio para a atenção no Sistema Único de Saúde? Rev Panam Salud Publica.(Internet). 2018(citado 24 maio 2022);42:e151. doi: 10.26633/RPSP.2018.151. [ Links ]

9. Benzaken AS, Pereira GFM, Costa L, Tanuri A, Santos AF, Soares MA. Antiretroviral treatment, government policy and economy of HIV/AIDS in Brazil: is it time for HIV cure in the country?.AIDS Res Ther. (Internet). 2019(citado 24 maio 2022);16(19).doi: 10.1186/s12981-019-0234-2. [ Links ]

10. Aquino EML, Silveira IH, Pescarini JM, Aquino R, Souza Filho JA, Rocha AS, et al. Medidas de distanciamento social no controle da pandemia de COVID-19: impactos potenciais e desafios no Brasil. Ciênc saúde coletiva . (Internet).2020(citado 24 maio 2022);25(supl 1). doi: 10.1590/1413-81232020256.1.10502020. [ Links ]

11. Castro SS, Scatena LM, Miranzi A, Miranzi Neto A, Nunes AA. Tendência temporal dos casos de HIV/AIDS no estado de Minas Gerais, Brasil, 2007-2016. Epidemiol Servir Saúde. (Internet).2020(citado 24 maio 2022);29(1). doi: 10.5123/S1679-49742020000100016. [ Links ]

12. Limas FM, Brandão ML, Luccas DS, Bossle RC, Khalaf DK, Chaves MMN. Análise espacial dos casos de HIV em adultos jovens e o acesso aos serviços públicos em um município do Paraná. Mundo da Saúde. (Internet). 2021(citado 24 maio 2022);45:337-347. doi: 10.15343/0104-7809.202145337347. [ Links ]

13. Rossi AM, Albanese SPR, Kuriaki AT, Birolim MM, Monroe AA, Arcêncio RA et al. Positividade ao HIV e fatores associados em um centro de testagem e aconselhamento. CiencCuidSaude. (Internet). 2021(citado 24 maio 2022);20:e50495. doi: 10.4025/cienccuidsaude.v19i0.50495. [ Links ]

14. Pimentel GS, Ceccato MGB, Costa JO, Mendes JC, Bonolo PF, Silveira MR. Qualidade de vida em indivíduos iniciando a terapia antirretroviral: um estudo de coorte. Rev Saude Publica.(Internet).2020(citado 24 maio 2022);54:146.doi: 10.11606/s1518-8787.2020054001920. [ Links ]

15. Felice BBL, Giovanini FS, Werneck AL. Barreiras na infraestrutura diante da pandemia covid-19: uma revisão sistemática. CuidEnferm. (Internet).2021(citado 24 maio 2022);15(1):111-118. Disponível em: Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/biblio-1290717 . [ Links ]

16. Eisinger RW, Lerner AM, Fauci AS. Human Immunodeficiency Virus/AIDS in the era of Coronavirus Disease 2019: a juxtaposition of 2 pandemics. J InfectDis. (Internet). 2021(citado 24 maio 2022);224(9):1455-1461. doi: 10.1093/infdis/jiab114. [ Links ]

17. Parikh N, Chaudhuri A, Syam SB, Singh P, Pal P, Pillala P. Diseases and disparities: the impact of COVID-19 disruptions on sexual and reproductive health services among the HIV community in India. Arch Sex Behav. (Internet). 2022(citado 24 maio 2022);51(1):315-329. doi: 10.1007/s10508-021-02211-5. [ Links ]

18. Gatechompol S, Avihingsanon A, Putcharoen O, Ruxrungtham K, Kurizkes DR. COVID-19 and HIV infection co-pandemics and their impact: a review of the literature. AIDS Res Ther . (Internet). 2021(citado 24 maio 2022);18(1). doi: 10.1186/s12981-021-00335-1. [ Links ]

19. Lopes LM, Andrade RLP, Arakawa T, Magnabosco GT, Nemes MIB, Ruffino Netto A, Monroe AA. Fatores de vulnerabilidade associados às internações por HIV/aids: estudo caso controle. RevBrasEnferm. (Internet). 2020 (citado 24 maio 2022);73(3). doi: 10.1590/0034-7167-2018-0979. [ Links ]

20. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD. Desenvolvimento humano nas macrorregiões brasileiras (Internet). Brasília: IPEA; 2016 (Internet). (citado 24 maio 2020). Disponível em: Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/20160331_livro-idhm.pdf . [ Links ]

21. Fernandes FS, Soares TM, Silva MF, Gomes JN, Freitas MN, Silva RR. Assistência em HIV/AIDS na Atenção Básica no Semiárido nordestino. APS em Revista. (Internet).2022(citado 24 maio 2022);4(1):3-11. Disponível em: https://doi.org/10.14295/aps.v4i1.168. [ Links ]

22. Pedrosa NL, Santos Vda F, Paiva Sde S, Galvão MT, Almeida RL, Kerr LR. Specialized care for people with AIDS in the state of Ceara, Brazil. Rev Saude Publica .(Internet).2015;49:77. doi: 10.1590/S0034-8910.2015049006028. [ Links ]

23. Mangal TD, Meireles MV, Pascom ARP, Coelho RA, Benzaken AS, Hallet TB. Determinants of survival of people living with HIV/AIDS on antiretroviral therapy in Brazil 2006-2015. BMC InfectDis. (Internet). 2019(citado 24 maio 2022);19. doi: 10.1186/s12879-019-3844-3. [ Links ]

24. Tavares TRP, Melo LP. “A gente vive em cima da corda bamba”: experiência de profissionais da saúde que trabalham com o HIV/AIDS em uma área remota do Nordeste brasileiro. Cad Saúde Pública. (Internet). 2018(citado 24 maio 2022);34. doi: 10.1590/0102-311X00063618. [ Links ]

25. Singer M. A dose of drugs, a touch of violence, a case of AIDS: conceptualizing the SAVA syndemic. Free InqCreatSociol. 1996(citado 24 maio 2022);24:99-110. [ Links ]

26. Nachega JB, Kapata N, Sam-Agudu NA, Decloedt EH, Katoto PDMC, Nagu T, et al. Minimizing the impact of the triple burden of COVID-19, tuberculosis and HIV on health services in sub-Saharan Africa. Int J InfectDis . (Internet). 2021(citado 24 maio 2022);113(Suppl 1). doi: 10.1016/j.ijid.2021.03.038. [ Links ]

27. Carma RA, Policena GM, Alencar GP, França EB, Bierrenbach AL. Subnotificação de óbitos por AIDS no Brasil: linkage dos registros hospitalares com dados de declaração de óbito. Ciência y Saúde Coletiva. (Internet). 2021(citado 24 maio 2022);26(4):1299-1310. doi: 10.1590/1413-81232021264.15922019 [ Links ]

Nota: Financiamento. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

Nota: La contribución de los autores en la realización del manuscrito fue equivalente. El presente trabajo fue aprobado para su publicación por el editor responsable

Recebido: 13 de Junho de 2022; Aceito: 23 de Agosto de 2022

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons