Introdução
A maior parte dos estudos sobre acidentes na infância aponta índices superiores a 50 % dos eventos no domicílio, e associam estatisticamente o ambiente doméstico à ocorrência de acidentes com crianças. Assim, a ocorrência de acidentes domésticos (AD) na infância é um problema de saúde pública1.
A despeito do que foi citado, verifica-se, geralmente, a escassez da capacidade protetora da família e o desconhecimento dos inúmeros fatores de risco que permeiam o cotidiano da criança, principalmente, dentro da própria casa2. Em virtude disso, as situações traumáticas e marcantes podem fazer com que o familiar e, em especial a mãe, sintam-se culpados por não terem tomado as devidas precauções ou delegado essa função a outras pessoas, o que fragiliza a família ao enfrentar as consequências do acidente3.
No Brasil, estudo realizado em 2011 analisou o perfil dos atendimentos de emergência por acidentes envolvendo crianças menores de 10 anos, onde constataram que 7.043 crianças foram vítimas de acidentes2. Nesse contexto, percebeu-se a necessidade de tornar acessíveis os resultados referentes ao crescimento gradativo de AD, possibilitando uma forma de orientação e prevenção de acidentes, a partir da exposição de casos, construindo, dessa maneira, um novo ponto de vista sobre essa temática. Além disso, acidentes envolvendo crianças menores de 5 anos acontecem, majoritariamente, no próprio domicílio, por se tratar do local onde passam a maior parte do tempo4.
É importante destacar que para a Organização Mundial de Saúde (OMS), acidente é um acontecimento casual que independe da vontade humana, ocasionado por um fator externo originando dano corporal ou mental4. Outrossim, a primeira infância corresponde a faixa etária que vai de zero a 6 anos e é um período muito importante para o desenvolvimento mental e emocional e de socialização da criança5.
Ainda, é na primeira infância que a criança consegue dominar a locomoção ereta até seu ingresso na escola, sendo caracterizada por intensa atividade e pelas descobertas. É uma época de significativo desenvolvimento físico e da personalidade. Ao longo desse período, as crianças desenvolvem suas habilidades motoras, emocionais, físicas, intelectual e social, porém enquanto esse processo não estiver completo, elas estão vulneráveis a uma série de perigos exigindo, portanto, cuidados especiais e atenção total6.
É evidente que algumas características da própria criança influenciam para o aumento do risco de acidentes, no entanto, outros fatores de diferentes dimensões também contribuem, como deixar a criança aos cuidados de outra criança, o qual o Ministério da Saúde recomenda que isso jamais aconteça. Portanto, a observação constante da criança pelo cuidador ou responsável e também a orientação sobre prevenção dos acidentes domésticos podem impactar a formação pessoal da criança3.
Diante do exposto, o presente estudo teve como objetivo identificar os riscos a que as crianças são expostas, bem como os trabalhos científicos que abordam a prevenção de acidentes domésticos na primeira infância.
Métodos
Trata-se de uma Revisão Integrativa (RI), a qual é um método de investigação que permite a procura, a avaliação crítica e a síntese das evidências disponíveis sobre um tema investigado, e usa o produto desse trabalho para orientar a prática e para planejar novas pesquisas7. O protocolo da RI seguiu seis etapas: elaboração da questão de pesquisa; definição dos critérios para a busca na literatura; coleta dos dados; análise crítica do material obtido; avaliação e interpretação criteriosa das informações obtidas; e apresentação dos resultados obtidos8).
Na primeira etapa, objetivou-se a definição de maneira clara da questão norteadora do estudo, para tal, foi utilizada a estratégia PICO para auxiliar no desenvolvimento, a qual apresenta os acrônimos P = Paciente ou Problema, I = Intervenção, C = Comparação ou Controle, O = Outcomes OU Desfecho9. Dessa forma, foi elaborada a questão: “O que se tem disponível na literatura sobre a prevenção de acidentes domésticos na primeira infância?”. Ademais, foi utilizada a lista de conferência específica Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), para guiar a RI, esta consiste em um checklist com 27 itens e um fluxograma de quatro etapas, possuindo como objetivo ajudar os autores a melhorarem o relato de revisões sistemáticas e meta-análises10.
Para a definição dos critérios para a busca na literatura, foram considerados as bases de dados: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), Banco de Dados de Enfermagem (BDENF), Web of Science e a Scientific Electronic Library Online (SciELO). Para a busca das publicações, foi utilizado a estratégia de busca avançada auxiliada pelo operador booleano “AND” associando aos descritores retirados da lista de Descritores em Ciência da Saúde (DeCS): “prevenção de acidentes”, “crianças” e “acidentes domésticos”.
Os critérios de inclusão dos estudos foram: título, resumo, relevância, full free, sem restrição de idiomas, além de possuir uma metodologia clara. Já os critérios de exclusão corresponderam aos artigos que não eram pertinentes ao tema e publicações anteriores a 2015. Para a coleta de dados, foi elaborado pelas autoras um banco de dados para facilitar a organização dos estudos. As variáveis aplicadas no banco de dados foram: título, ano, nível de evidência e os achados importantes, para que dessa forma seja mais prática a identificação das informações pertinentes de cada artigo. Para avaliar o nível de evidência dos artigos foi utilizado o método Oxford Centre for Evidence-based Medicine11, que classifica a evidência em 1a, 1b, 1c, 2a, 2b, 2c, 3a, 3b, 4 e 5, como detalhado abaixo (Quadro 1).
Na quarta etapa, houve a análise crítica dos estudos incluídos, os quais foram avaliados de forma detalhada, de acordo com a metodologia empregada, resultados obtidos e capacidade de contribuir com o objetivo desta pesquisa. Diante disso, essa etapa foi realizada por quatro revisoras independentes e, na ausência de consenso, mais um revisou e analisou o ponto discordante.
Durante a avaliação e interpretação criteriosa das informações obtidas, os dados de cada artigo incluído no estudo foram profundamente analisados e discutidos, comparando-os a luz de referencial teórico pertinente e atual, dessa forma, foi conceituado os pontos pertinentes dos estudos e a capacidade deles de contribuir para a pesquisa. Posteriormente, foram elaboradas propostas de recomendações e sugestões para futuras pesquisas sobre a temática.
Na última etapa, que consiste na apresentação dos resultados obtidos, foi criado um resumo das evidências disponíveis, contemplando a descrição das etapas percorridas e os principais resultados evidenciados da análise dos artigos incluídos, o que resultou na criação de um documento que descrevesse detalhadamente a revisão.
Tendo em vista que os dados usados foram extraídos de plataformas de domínio público, este estudo não foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Entretanto, destaca-se que todos os aspectos contidos na Resolução do Conselho Nacional de Saúde 466/12 foram observados.
Resultados
O cruzamento dos descritores nos bancos de dados selecionados, resultou em 125 registros, após adicionar os filtros de critérios de inclusão, totalizou-se 117 artigos, com isso, foram selecionados 22 artigos após leitura dos títulos e resumos destes para avaliar a sua elegibilidade, sendo 10 artigos incluídos na revisão. O detalhamento da inclusão dos trabalhos está representado pelo fluxograma PRISMA presente na Figura 1.(Figura 1).
Para os 10 artigos selecionados para a RI, foi construído um quadro composto por título, nível de evidência, base de dados e os objetivos principais dos artigos selecionados (Quadro 2).
Em relação às bases de dados dos trabalhos selecionados, a maioria corresponde à Medline (oito), um à BDENF e um à LILACS. Já quanto ao nível de evidência constata-se que três correspondiam ao nível de evidência 3B, dois ao nível 2B e dois ao nível 2C. Enquanto os três restantes ao nível de evidência 1A, 1B e 3A. Portanto, grande parte dos estudos eram observação de resultados terapêuticos.
A análise dos resultados encontrados privilegiou as questões relativas aos aspectos físicos e psicológicos dos acidentes domésticos. Alguns artigos chamam a atenção para problemas específicos como: quedas, queimaduras, envenenamento e tombamento de aparelhos televisivos.
Em relação à óbitos, no artigo voltado para acidentes relacionados com tombamento de aparelhos televisivos destaca que a taxa de letalidade varia amplamente, mas cerca de 96 % dos óbitos foram ocasionados devido a lesões cerebrais. Outrossim, o mesmo artigo aponta que crianças pequenas podem sofrer lesões cerebrais secundárias ou morte causadas por asfixia mecânica devido ao seu pequeno tamanho em relação à televisão.
Ainda, foi possível observar que a maioria das crianças acidentadas pertenciam ao sexo masculino e possuíam idade pré-escolar. Em relação ao ambiente familiar, foi notório que a maioria das famílias dos estudos analisados eram de baixa renda, bem como, haviam várias pessoas morando na mesma residência e a maioria das mães eram adultas jovens. Ademais, também foram identificadas as fontes de risco para acidentes na primeira infância, as intervenções realizadas e dados de como prevenir essas intercorrências no ambiente domiciliar.
Discussão
Acidentes domésticos e principais causas na primeira infância
De acordo com Brito et al., a razão pela qual o lar é considerado a maior fonte de risco para acidentes, se deve ao fato das crianças passarem a maior parte do tempo neste ambiente, mas também há outros motivos como: pisos molhados, móveis com quinas, vidros, berços sem proteção, camas elevadas e brinquedos espalhados12. Além disso, pela análise de determinada pesquisa, notou-se que os meninos têm maior predisposição a sofrer acidentes, a qual pode ser justificada por fatores culturais ou as diferenças de comportamento de cada sexo, proporcionando a eles mais liberdade que às meninas17)(20)(21.
A prevalência do sexo masculino pode está associado ao fato que os meninos tendem a se envolverem em atividades de maiores riscos e possuem um comportamento mais impulsivo em comparação com as meninas. Enquanto os meninos se envolvem em brincadeiras com velocidade, agressividade e mais contato físico, além de possuírem uma maior liberdade, as meninas tendem a possuir um comportamento mais brando, com brincadeiras mais amenas, como também destas estarem submetidas a uma maior vigilância por parte de seus responsáveis, em vista de questões culturais, sociais e educacionais22)(23.
Ademais, Keall et al.13 afirmam que o principal mecanismo de lesões domiciliares também são as quedas e o início da capacidade de andar por volta de um ano de idade aumenta esse risco, por isso crianças menores de um ano de idade precisam receber atenção redobrada. Portanto, deixá-las sozinhas, mesmo que por um curto intervalo de tempo pode provocar algum tipo de acidente14. Em virtude disso, pode-se citar que as crianças pequenas não têm percepção e consciência de muitos riscos. Isso acontece porque a capacidade cognitiva das crianças de reconhecer e evitar o perigo não se desenvolveu totalmente, deixando-as mais vulneráveis a lesões15.
Nesse contexto, é válido destacar que o estágio de desenvolvimento infantil, desencadeia o interesse exploratório, facilitando a propensão a ingestão devido a descoberta oral e o contato visual, que pode ser um problema, pois muitas crianças tentam imitar os comportamentos dos adultos, quando eles estão comendo pastilhas ou chiclete, logo ao assisti-los vão tentar fazer o mesmo19.
Crianças em fase pré-escolar são as mais acometidas em acidentes domésticos, pois estão passando pela fase de desenvolvimento da coordenação motora, cognição e interação social, o que acaba por dificultar o reconhecimento dos perigos que as cercam23.
Vários fatores influenciam na incidência e no padrão de lesões domésticas não intencionais, não é apenas a idade ou o gênero da criança, mas a habitação, membros da família, baixo nível educacional, visto que podem ter menos precaução e mães que trabalham, porque elas passam menos tempo com as crianças12)(16. Assim, os acidentes na infância podem estar relacionados a aspectos ambientais, sociais, econômicos e culturais12. Além disso, outro estudo revelou que as mães com seus primeiros filhos são mais atentas a respeito das lesões infantis do que aquelas com vários filhos16.
Ainda, mães jovens, em sua maior parte, adolescentes, provindas de famílias mais carentes e detentoras de baixa escolaridade, por possuírem menos experiências, pode ser um dos fatores desencadeadores para maiores ocorrências de acidentes domésticos com crianças24. No estudo de Barcelos et al., é apresentado que filhos de mães adolescentes e de mães com baixa escolaridade são mais propensos a serem vítimas de acidentes, onde no estudo mostra que a incidência de quedas e cortes de meninas filhas de adolescentes foi duas vezes maior do que entre as filhas de mães com mais de 30 anos24.
Em contrapartida, em relação aos meninos filhos de adolescentes a incidência de quedas e de cortes, foi respectivamente, 50 % e 80 % maiores em comparação a incidência de quedas e cortes de meninos filhos de mães com mais de 30 anos. Ademais, em relação aos acidentes de mães com baixa escolaridade, foi evidenciado que a incidência de queimaduras entre as meninas foi três vezes maior quando a mãe tinha baixa escolaridade (0-4 anos de estudo) em comparação com as das mães com mais de 8 anos de educação formal24.
Percebe-se que o perfil econômico das famílias está relacionado à propensão de acidente no ambiente doméstico, pois a falta de recursos financeiros impossibilita que sejam instaladas estruturas de proteção, como colocar borracha antiderrapante no chão do banheiro e colocar grade de proteção nas janelas12)(16)(17.
Além do mais, a ocorrência de acidentes é maior entre indivíduos de menor renda, tanto em países de média e baixa renda quanto nos países mais ricos24. Outrossim, apesar dos acidentes domésticos relacionados com crianças estarem envoltos de aspectos sociais e econômicos, os quais são caracterizados pela ausência de informações, de infraestrutura adequada, de espaços de lazer, da falta de direcionamento à prevenção de acidentes das instituições de ensino e de políticas públicas, ressalta-se que os acidentes ocorrem independentemente de classe social25.
Por outro lado, precisa-se estar atento para a ocorrência de fraturas em lactentes, em que deve sempre levantar a suspeita de possíveis maus-tratos. Especialmente, em casos com história obscura ou implausível, fraturas de ossos longos e fraturas múltiplas estão associadas a maus-tratos14. Adicionalmente, é viável salientar que existe o risco de tombamento da televisão ao longo do dia, pois estima-se que as crianças de 2 a 5 anos passam mais de 32 horas por semana assistindo TV. O peso dos aparelhos televisivos e os cantos pontiagudos podem causar lesões penetrantes, levando a lacerações da face ou couro cabeludo e fraturas cranianas de força contusa mais grave15.
Os acidentes infantis relacionados com o tombamento de aparelhos televisivos podem ocasionar traumatismo craniano, visto que crianças pequenas possuem um crânio mais fino e a proporção cabeça-corpo as predispõem a maiores riscos de lesões na cabeça. Embora a maioria dos casos não sejam fatais, podem ocasionar ferimentos graves e sequelas futuras26.
Alinhando-se a essa realidade, alterações no design dos aparelhos de TV podem ser feitas para ajudar a torná-los mais seguros e evitar um acidente fatal. A colocação de rótulos alertando para o tombamento nos aparelhos de TV, também é fundamental, pois aumenta a conscientização. Em última análise, suportes mais baixos e largos reduzirão o risco associado à queda porque uma TV caindo de uma altura mais baixa obtém velocidade mais baixa antes do impacto, e maior estabilidade diminuirá o risco de tombar em colisões com o suporte15.
Ainda, em um dos artigos encontrados foi constatado que as queimaduras provenientes das escaldaduras ou das lesões por líquidos aquecidos são mais extensas e têm maior incidência em crianças de seis meses a dois anos17. Nessa mesma concepção, outro artigo afirma que as crianças têm uma maior tendência de serem hospitalizadas por queimaduras, visto que 87 % das crianças menores de 6 anos são internadas por esse motivo18. Entretanto, os acidentes com chamas são mais observados em crianças a partir da idade pré-escolar (2-4 anos), isso pode estar associado ao fato de que o desenvolvimento neuropsicomotor é intenso nesta fase e ele estimula a sua curiosidade em relação à exploração do ambiente em que vive17.
As queimaduras são as lesões mais devastadoras que o corpo humano pode sofrer, porque além do risco de morte, as complicações, como septicemia e falência renal e cardiorrespiratória, poderão induzir a importantes modificações metabólicas, bem como a sequelas físicas e psicológicas. Além disso, as cicatrizes podem prejudicar o aspecto psicossocial do paciente17.
Afirma-se que cerca de 90 % das queimaduras ocorrem dentro de casa, sendo a cozinha o local onde ocorre a maior parte dos acidentes17. Corroborando com essa afirmação, encontrou-se objetos perigosos que podem facilmente causar queimaduras, dentre eles: uma chaleira ou sopa quente localizada sobre a mesa ou um fogão a gás, uma garrafa de água ou balde de água com líquido quente dentro, localizado no chão da cozinha, por exemplo, uma garrafa de água quente ou óleo quente em um fogão a gás e uma bebida quente no balcão da cozinha18.
Ressalta-se que a ocorrência de escaldaduras com líquidos superaquecidos em crianças, reflete o descuido dos pais ou tutores no momento de manuseio de alimentos na cozinha e durante a preparação das refeições. Ainda, crianças tendem a serem imprevisíveis, podendo puxar para si objetos com muita rapidez e destreza, até mesmo objetos que contenham líquidos superaquecidos, ocasionando assim o derramamento sobre os seus corpos, quanto mais aquecido estiver o líquido, e quanto maior for a amplitude das regiões atingidas, maiores serão os danos nas peles sensíveis das crianças. As regiões do corpo mais comumente afetadas durante esses incidentes são o tórax, seguido por braços, face, cabeça e coxa27.
A partir das investigações científicas também foi averiguado que o envenenamento é considerado a quinta causa mais comum no mundo de fatalidade em crianças menores de cinco anos. As principais categorias que afetam crianças nessa idade são: soluções de limpeza comuns, cosméticos, produtos de higiene pessoal e medicamentos19.
Em 2005, o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas da Fundação Oswaldo Cruz notificou 84.356 casos de intoxicação humana no país, com maior número de ocorrências entre zero e 5 anos de idade, que apresentou 17.238 (22,3 %) casos e registro de 30 óbitos. A maior parte dos casos de intoxicação exógena ocorre em crianças menores de 5 anos de idade, pois estas, tecnicamente, estão mais expostas aos riscos de envenenamento devido à sua natureza curiosa inerente à faixa etária e ao desenvolvimento infantil em sua fase inicial, constituindo assim, um grave problema de saúde pública28.
Um estudo australiano realizado com crianças de 1-3 anos, destacou que o armazenamento acessível, ou seja, ao alcance das crianças, de medicamentos em banheiros aumentou as chances de envenenamento. Outro estudo com crianças de 0-4 anos sobre o armazenamento de substâncias tóxicas em caixas ou armários no chão e de querosene e gasolina em garrafas de refrigerante, obteve o mesmo resultado. Infere-se também que nas famílias de adultos solteiros cuja supervisão pode ser mais desafiadora, as chances de envenenamento são maiores21.
Em relação às etapas de desenvolvimento, salienta-se que os riscos de intoxicação exógenas diferem de uma para outra. Em crianças menores de um ano, as quais não possuem independência motora e se expressam pelo choro, as intoxicações desta faixa etária são ocasionadas, geralmente, por administração incorreta de medicamentos ou outras substâncias por seus pais e/ou responsáveis28.
Em contraponto, crianças na faixa etária de 1-4 anos já são mais independentes, conseguem andar, alcançar objetos, manuseá-los e colocá-los na boca, ocorrendo dessa maneira os acidentes. Ainda, os tutores responsáveis tendem a subestimar as crianças e deixam substâncias tóxicas ao alcance destas. Intoxicações exógenas em crianças na faixa etária de 5-9 anos são menos comuns, pois à medida que as crianças crescem, afastam-se do ambiente domiciliar e tornam-se mais independentes, sendo mais expostas a riscos ambientais em si28.
As causas das intoxicações exógenas podem estar relacionadas também com o aspecto visual das embalagens dos produtos, onde as cores chamam a atenção das crianças, além disso, os produtos por possuírem um sabor agradável e serem compostos de desenhos que atraem o interesse da criança, bem como, a ausência de Embalagem Especial de Proteção à Criança (EEPC), podem ser fatores causais do aumento das intoxicações exógenas28.
Prevenção de acidentes domésticos na primeira infância
A OMS e a UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância - recomendam visitas domiciliares por profissionais da saúde na primeira semana de vida do bebê. Assim, a transmissão de informação individual ampliada, por meio das visitas domiciliares, pode reduzir riscos potenciais em casa16.
Ademais, o conhecimento exato do local do acidente, as circunstâncias e o mecanismo da lesão que levou às fraturas é de fundamental importância para o desenvolvimento de estratégias de prevenção e campanhas de conscientização14. Todavia, um estudo destacou que as modificações nas casas para evitar acidentes são escassas, visto que são realizadas, normalmente, para pessoas com deficiência. Sendo que as alterações domésticas com foco em perigos bastante comuns, podem reduzir os casos de quedas13.
Pode-se citar como exemplo: corrimãos para degraus externos e escadas internas; reparos em travas de janela; corrimãos para banheiros; iluminação externa adequada; borda de alta visibilidade e antiderrapante para degraus externos; fixação de bordas elevadas de tapetes e esteiras; tapetes de banho antiderrapantes13.
Ainda, a educação em saúde é essencial para a prevenção de envenenamento, que pode ser fornecida durante o contato com as crianças pequenas, como também com as famílias dessas crianças. Dentre as precauções é possível citar: armazenar medicamentos fora do alcance e com segurança (de preferência trancados) e guardar medicamentos e produtos domésticos imediatamente após o uso21.
Vale salientar que o domicílio e a escola são locais de alto risco para ocorrência de acidentes, uma vez que são os ambientes mais frequentados pelas crianças, mas também o local ideal para intervenções preventivas, visto que essas são adaptadas ao contexto no qual estão presentes os fatores de risco. Assim, pode-se promover comportamentos seguros e reduzir lesões traumáticas na infância20.
Destarte, orientação familiar, mudanças no espaço domiciliar e identificação de fatores de risco, de acordo com o estágio de desenvolvimento da criança e dos hábitos comportamentais comuns ao período de idade, foram fatores importantes para a formulação de intervenções efetivas na prevenção de acidentes na infância20.
Ainda, os materiais de advertência têm grande relevância, porque possuem mensagens de cuidados destinados às crianças e a seus responsáveis, cujo intuito é destacar o perigo e a possibilidade de lesões por comportamentos inseguros e, assim evitá-los. O uso de imagens ou fotos também ajuda a criança a entender quais são os objetos perigosos, os fatores ambientais e, dessa maneira, evitar atitudes tomadas pelos pequenos que podem fazer mal a eles mesmos18.
Destaca-se que a educação em saúde é um ponto chave na prevenção de acidentes domésticos relacionados com crianças, onde irá promover a saúde por um desenvolvimento infantil saudável, assim, através dela poderá ser possível evitar prováveis sequelas que podem comprometer a criança que está em pleno desenvolvimento, sendo importante a estimulação de práticas preventivas aos acidentes infantis, seja no ambiente doméstico ou escolar23.
Ademais, a enfermagem, bem como os demais profissionais, devem manter-se atualizados com as informações mais recentes para que possam fornecer a orientação certa aos pacientes e aos próprios familiares, promovendo um estado de boa saúde. A educação sobre prevenção de envenenamento pode ser fornecida durante contatos com crianças, quando prescrevendo para famílias com crianças pequenas e após eventos de envenenamento12)(21. Nessa perspectiva, os ambientes comunitários, principalmente os ambientes escolares, são um ótimo lugar para transmitir informações aos pais19.
Conclusão
Ao nos debruçar sobre os objetivos desta pesquisa, foi possível identificar como fatores de risco: pisos molhados, móveis com quinas, vidros, trocador, berços e/ou cama sem proteção, camas elevadas, saídas e passagens mantidas com brinquedos, caixas ou outros itens
que possam ser obstrutivos, quedas, queimaduras, envenenamento e tombamento de aparelhos televisivos. Outro aspecto observado foi que o ambiente domiciliar constitui o principal deflagrador de acidentes domésticos na primeira infância, pelo fato de ser um meio em que a criança passa grande parte do seu tempo.
Nesse sentido, algumas modificações na casa para a prevenção desses acidentes podem ser realizadas, por exemplo, colocar corrimão quando houver escadas, fixar bordas elevadas de tapetes, no entanto, a falta de recursos financeiros impossibilita que sejam instaladas estruturas de proteção. Desse modo, os profissionais da saúde devem desenvolver ou potencializar programas de prevenção, principalmente voltados para aqueles que são vulneráveis social ou economicamente, a fim de capacitar a população quanto à identificação e minimização dos risco.
Os pais e/ou responsáveis pelas crianças são essenciais para evitar os acidentes que ocorrem no lar. Por isso, não devem subestimar qualquer fator que ofereça risco, desta forma, é imprescindível educar seus filhos sobre as fontes perigosas a fim de evitar consequências que contemplam desde danos irreversíveis até a morte. Portanto, espera-se que essa temática ganhe notoriedade necessária e, assim, contemple as diversas partes do mundo com esses conhecimentos científicos, evitando que as crianças sejam hospitalizadas ou internadas. Por fim, almeja-se que a partir desse artigo mais estudos sejam elaborados e aprofundados