A Ansiedade de Exame (AE) é caracterizada por reações emocionais e físicas (por exemplo, pânico, tontura e sensação de medo) acompanhadas por pensamentos preocupantes sobre a reprovação e suas consequências (Putwain, Pekrun, Rainbird, y Roberts, 2022). O constructo foi estabelecido considerando uma característica específica de ocasiões em que as pessoas percebem situações avaliativas como ameaçadoras. Esse tipo específico de ansiedade é compreendido como uma forma de ansiedade de avaliação social (Cassady y Johnson, 2002), que é observada em diferentes situações, que incluem avaliações de desempenho (Silva, Santos et al., 2023). Esse é um dos principais fatores que ocasionam o mal desempenho (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022), além de causar decréscimos à saúde mental dos estudantes universitários (Silva et al., 2023).
Ressalta-se que ainda não há uma concordância entre pesquisadores sobre uma definição da AE, que englobe os diferentes agentes que envolvem o fenômeno. Entretanto, verifica-se um consenso de que o construto deva reunir pelo menos dois fatores: a) emoção: que envolve sintomas fisiológicos como sudorese, aumento da frequência cardíaca e nervosismo, e b) preocupação: que que é a expressão cognitiva de inquietude com o próprio desempenho (Silva et al., 2022), que inclui pensamentos de preocupação em relação a um possível fracasso e suas consequências (Putwain et al., 2022).
Uma alternativa de conceituar os diferentes fatores da AE parte de um modelo biopsicossocial, que abrange três processos diferentes: a) cognição (pensamentos), b) aspectos afetivos-fisiológicos, e c) comportamentos (Silva et al., 2023). A cognição, inclui pensamentos negativos que interferem na prova (e.g., pensamentos sobre a humilhação social, autodepreciativos ou sobre o fracasso). As reações fisiológicas, referem-se à excitação autonômica que acontece durante a situações avaliativas, como a excitação emocional (e.g., aumento do ritmo cardíaco ou tensão muscular). O comportamento, concerne sobre como o indivíduo age em situações avaliativas, que incluem comportamentos adaptativos (por exemplo, manter a atenção durante a prova), e desadaptativos (e.g., evitação e procrastinação) (Furlan y Martínez- Santos, 2023). Outras variáveis como perfeccionismo e procrastinação também estão relacionadas ao mecanismo da AE (Jolly, Garratt-Reed y McEvoy, 2022; Silva, Santos et al., 2023). Por exemplo, sabe-se que pessoas com traços perfeccionistas desadaptativos tendem a adotar estratégias ou comportamentos de evitação à tarefa, que são manifestados pela procrastinação (Burcaş y Creţu, 2021). Isso ocorre quando o medo excessivo de críticas ou fracasso impedem o indivíduo de realizar uma tarefa (Furlan y Martínez-Santos, 2023).
A literatura também tem apontado consequências associadas a conduta de AE, como procrastinação acadêmica, que se refere a um comportamento situacional desadaptativo, ou seja, uma falha de autorregulação, que implica numa conduta desreguladora ativa, por meio da qual os indivíduos adiam ou evitam tarefas acadêmicas, que são percebidas como aversivas, visando obter um efeito positivo de curto prazo (Silva et al., 2020). Essas situações desadaptativas incluem atenção tendenciosa à ameaça, ativando estratégias acadêmicas de autocobrança, que muitas vezes são impulsionadas pela evitação (Putwain y Symes, 2020). Tais condutas ansiogênicas tendem a retardar o avanço no curso acadêmico, produzindo acúmulo de matérias derivadas de possíveis reprovações, o que pode ocasionar insatisfação e um desempenho acadêmico inadequado (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018).
Dado o exposto, salienta-se a relevância sobre a temática de AE, os estudos têm se concentrado apenas nas dimensões cognitivas e afetivo-fisiológicas, sendo pouco explorados os aspectos relacionados à conduta de ansiedade (Aguayo, 1999; Silva et al., 2022; Stöber, 2004). Nessa linha, salienta-se que identificar condutas problemáticas relacionadas a AE ajudaria a entender de maneira mais adequada quais dificuldades os acadêmicos apresentam para enfrentar as avaliações (Furlan, 2013). Além disso, sabe-se que combinar estratégias cognitivas e comportamentais são eficazes em programas focados em reduzir a AE. Essas intervenções podem melhorar o ensino, a aprendizagem e o desempenho durante uma avaliação; utilizando-se, por exemplo, de técnicas cognitivo-comportamentais para regular as emoções, antes e durante a prova (Furlan y Martínez-Santos, 2023).
Nesse sentido, salienta-se que instrumentos prévios, mesmo que indiretamente, tem abordado apenas a conduta de evitação da prova (Furlan, 2013), como por exemplo, Cuestionario de Ansiedad en los Exámenes (CAEX), que avalia aspectos cognitivos, fisiológicos e comportamentais (Aguayo, 1999), Coping with Pre-Exams Anxiety and Uncertainty Scale (COPEAU) (Stöber, 2004), que avalia as estratégias relacionadas a incerteza ocasionada pelo contexto avaliativo, sendo duas adaptativas: (a) Orientação para a tarefa e preparação, e b) busca de apoio social), além de uma desadaptativa de evitação. Devido a isso, Furlan (2013) elaborou a Escala Conductual de Ansiedad Frente a los Exámenes (ECAE), que foi aplicada, inicialmente, em contexto argentino.
A ECAE, é um instrumento composto por 14 itens que avaliam duas dimensões da conduta de ansiedade. Há, portanto, um fator denominado evitação, já identificado em instrumento prévio, por exemplo, do CAEX (Aguayo, 1999), além do fator dificuldades de execução. Especificamente, a conduta de evitação funciona como uma forma de prevenção a estímulos negativos, por meio do comportamento de postergação e inibição motora frente a estímulos aversivos (Furlan, y Sánchez-Rosas, 2018), neste caso a situação avaliativa. Já o fator déficit de execução, que corresponde a dificuldade de realizar as tarefas da prova, como a demora em responder (que impede o indivíduo de completar a avaliação), ou erros e omissões por falta de certeza nas respostas (Furlan, 2013; Furlan y Sánchez-Rosas, 2018). Essas características são consideradas como fundamentais para explicar a AE, pois a possibilidade de fracassar na execução da tarefa e exibir incompetência frente os outros faz com que o aluno manifeste sintomas ansiosos em contextos avaliativos (Furlan y Martínez- Santos, 2023).
A versão inicial da ECAE foi composta por 16 itens, que foram distribuídos entre os dois fatores, com adequada consistência interna (alfa de Cronbach, α) dificuldade de execução (α= 0,81) e conduta de evitação (α= 0,78). Também foram reunidas evidências de validade convergente com ansiedade cognitiva de provas, que foi avaliada pela Cognitive Test Anxiety Scale (CTAS) (Cassady y Johnson, 2002), instrumento que foi adaptado para o contexto brasileiro por Medeiros et al. (2020).
Posteriormente, baseando-se na primeira versão da ECAE (Furlan, 2013), foi elaborada a Escala Conductual de Ansiedad ante Exámenes Numéricos. Nessa oportunidade, a medida em questão foi adaptada para o contexto venezuelano, abrangendo disciplinas de cunho numérico. Para tanto, alguns itens foram modificados, para abarcar conteúdos matemáticos e estatísticos. O instrumento apresentou adequada consistência interna, corroborando uma estrutura interna bifatorial, com seus valores variando de 0,90 a 0,95 (Lange, Rincón-Macea, D’Aubeterre-López, Trabucco-Ferro, y Mebarak-Chams, 2022). Nesse contexto, observa-se também a Escala de Evitación Conductual en Exámenes Orales (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018). O instrumento foi elaborado para universitários argentinos, objetivando avaliar a esquiva comportamental em provas orais. Os 14 itens medem inibição e adiamento da evitação comportamental em exames orais, que apresenta evidências favoráveis de validade e confiabilidade, para avaliar dois aspectos de evitação comportamental em exames orais.
Os estudos supracitados evidenciam o esforço de pesquisadores em avaliar a conduta de ansiedade em diferentes países. Isto possibilitou um melhor entendimento referente aos antecedentes e consequentes da conduta de ansiedade em contextos avaliativos, reunindo evidências empíricas em amostras clínicas, que possibilitaram o planejamento de propostas interventivas (Furlan y Martínez- Santos, 2023). Especificamente, no cenário brasileiro, apesar de existirem pesquisas centradas na ansiedade em contextos avaliativos (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022), esses estudos focam no componente cognitivo da ansiedade de provas. Por exemplo, Medeiros et al. (2020) adaptou a CTAS para o Brasil, reunindo evidências referentes a estrutura interna da medida, que apresenta bons parâmetros psicométricos e tem sido utilizada em diferentes pesquisas, que ajudaram a compreender como a ansiedade de provas está associada a diferenças individuais, como a personalidade e variáveis demográficas (Silva et al., 2022) ou na explicação de comportamentos disfuncionais, como a procrastinação acadêmica (Silva et al., 2023).
Entretanto, apesar do componente cognitivo ter se demonstrado relevante na explicação da ansiedade de provas e seus correlatos, existe a necessidade de ampliação das pesquisas para melhor compreensão do construto, uma vez que a AE, além da dimensão cognitiva, envolve outras duas, nomeadas, respectivamente, de emocional e comportamental. Sendo a primeira caracterizada por reações fisiológicas, excitação emocional, maiores níveis de tensão e ansiedade. E a segunda, que inclui o foco em comportamentos relevantes e irrelevantes para a tarefa (Medeiros et al., 2020). Considerando que a AE é uma temática relativamente nova no Brasil (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022; Silva et al., 2023), decidiu-se contribuir com o tema através da adaptação da ECAE, que se configura como uma medida que foi projetada para capturar comportamentos que são frequentes em estudantes com elevada ansiedade de provas (Furlan, 2013).
Assim, esse estudo tem como objetivo adaptar a Escala Comportamental de Ansiedade aos Exames (ECAE) (Furlan, 2013) para o português brasileiro, reunindo evidências de validade e precisão, além de verificar a validade convergente da medida. Considerando esse último aspecto de validade (convergente), estima-se que os fatores da ECAE apresentem associações positivas com ansiedade cognitiva de provas (Furlan, 2013). Para tanto, foram planejados dois estudos empíricos, apresentados a segui.
Método
Participantes
Contou-se com uma amostra total, não probabilística (de conveniência) de 462 estudantes universitários de Instituições de Ensino Superior (IES) públicas (M idade = 21,63; DP = 4,58; variando de 18 a 64 anos), oriundos da cidade de Parnaíba, Piauí, Brasil. Estes eram em maioria do gênero feminino (60,8%), solteiras (85,9%), de diferentes áreas de conhecimento, que eram majoritariamente das ciências humanas (46,8%) e Ciências Sociais Aplicadas (19,9%), que cursavam em maioria Psicologia (44,2%) e Ciências Contábeis (11,5%). A seguir, serão apresentados os perfis sociodemográficos dos participantes. Reforça-se que a pesquisa foi dividida em duas amostras distintas, que compuseram o estudo 1 (N1), sendo realizada uma Análise Fatorial Exploratória (AFE) e o estudo 2 (N2), procedendo uma Análise Fatorial Confirmatória (AFC).
N 1 - Contou-se com uma amostra não-probabilística (por conveniência) de 223 estudantes de instituição pública de ensino superior. Esses tinham em média 21,57 anos de idade (DP = 5,35; amplitude 18 a 64 anos), sendo a maioria do gênero feminino (61,9%) e solteiros (82,5%), das Ciências Humanas (30,9%), Ciências Agrárias (18,2%) e Ciências Biológicas (17,7%), respectivamente. Esses cursavam, principalmente, Psicologia (26%), além de Licenciatura em Biologia e Engenharia de Pesca (17,7%).
N 2 - Participaram do estudo 239 universitários, selecionados de maneira não-probabilística (por conveniência), que tinham em média 21,68 anos de idade (DP = 3,71, variando de 18 a 37 anos), sendo a maioria do gênero feminino (59,8%) e solteiro (89,1%), das Ciências Humanas (61,5%) e cursando Psicologia (61,1%).
Instrumentos
Escala Comportamental de Ansiedade aos Exames (ECAE) (Furlan, 2013). Reúne 14 itens, que avaliam a conduta de ansiedade por dois fatores: dificuldades de execução e conduta de evitação. Os itens são respondidos por uma escala do tipo Likert de quatro pontos, variando de 1 “Nada frequente em mim” a 4 “Muito frequente em mim”.
A Cognitive Test Anxiety Scale (CTAS) (Cassady y Johnson, 2002) foi adaptada para o Brasil por Medeiros et al. (2020) e reúne 16 itens, que são respondidos em escala de cinco pontos tipo Likert, variando entre 1 “Nada frequente em mim” a 4 “Muito frequente em mim”. Nesta pesquisa a confiabilidade foi de (α = 0,94) e (ω = 0,95).
Questionário sociodemográfico, com perguntas, como sexo, idade, curso, estado civil e renda familiar, que foram utilizadas com o objetivo de caracterizar a amostra.
Procedimento
Inicialmente, o projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) de uma instituição pública brasileira e seguiu as normas e as recomendações das resoluções 466/12 e 510/16 do Conselho Nacional de Saúde (CAAE: 54449321.8.0000.5209, parecer: 5.213.273). Após a autorização do CEP, a ECAE foi traduzida para o português brasileiro, por meio do método do Back Translation (Pasquali, 2016), contando com dois tradutores independentes que fizeram traduções às cegas, visando verificar a equivalência dos itens das duas versões (português e espanhol), fazendo adequações e correções nos itens, quando necessário.
Em seguida, foi realizado o processo de validação semântica, que contou com 20 universitários do primeiro e último período de uma instituição pública, considerando os procedimentos estabelecidos por Pasquali (2016). Os instrumentos foram aplicados em ambiente de sala de aula, porém, foram respondidos de maneira individual. Previamente, com a autorização dos diretores e coordenadores de cada curso da instituição de ensino selecionada para a pesquisa. Aos que aceitavam participar, era apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para que os participantes pudessem autorizar sua participação na pesquisa. Foi assegurado a todos o caráter anônimo e confidencial das respostas, além disso, era enfatizado o caráter voluntário da participação na pesquisa e que não traria nenhum prejuízo ou bônus aos participantes, e que poderiam desistir a qualquer momento sem ônus.
Análise de Dados
Com o SPSS 26 foram realizadas análises descritivas. Com o software Factor 12.01.03, averiguou-se a dimensionalidade da ECAE. Com a N1, realizou-se uma Análise Fatorial Exploratória, com estimador Diagonally Weighted Least Squares (DWLS) e rotação varimax. Para definir o número de fatores, utilizou-se da análise Paralela, além de indicadores complementares de acurácia (clonesses) de unidimensionalidade, especificamente o Unidimensional Congruence (UniCo) e Explained Common Variance (ECV), (valores > 0,95 no primeiro e maiores < 0,85 no segundo indicam dados essencialmente unidimensionais) (Ferrando y Lorenzo-Seva, 2018).
Com a N2, com o software R e pacote lavaan, procedeu-se uma análise fatorial confirmatória, com o estimador Weighted Least Squares Mean and Variance-Adjusted (WLSMV), considerando os seguintes indicadores (Hair, Black, Babin, y Anderson, 2019; Tabachnick y Fidell, 2013): a) Comparative Fit Index (CFI) e b) Tucker-Lewis Index (TLI), com valores aceitáveis > 0,90; c) Root-Mean-Square Error of Approximation (RMSEA) e intervalo de confiança de 90% (IC90%), recomenda-se valores entre 0,05 e 0,08, indo até 0,10.
A precisão da medida foi calculada pelo alfa de Cronbach (α) e Ômega de McDonald (ω), com o pacote semTools. Para reunir evidências de validade da ECAE baseado na sua relação com variáveis externas (ansiedade cognitiva de provas), foram consideradas magnitudes entre 0,20 a 0,50 (Nunes y Primi, 2010). Ademais, o conjunto de dados que suporta os resultados deste estudo não está disponível.
Resultados
Estudo 1. Adaptação e Evidências de Validade e Precisão da Escala Comportamental de Ansiedade aos Exames (ECAE)
Inicialmente, os resultados do índice de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO)= 0,84 (IC95% = 0,74 - 0,85) e o Teste de Esfericidade de Bartlett, X2(91) = 843,2; p<0,001, atestaram que era possível realizar a análise fatorial exploratória, com rotação varimax, para conhecer a estrutura fatorial dos 14 itens da ECAE. A análise Paralela sugeriu uma solução bidimensional (Comparative Fit Index (CFI)=0,993 (IC95% = 0,995 - 0,997)). Os valores próprios (autovalores) foram, respectivamente 4,50 e 1,70, explicando 44,30% da variância total dos itens. Além disso, foi considerado outros indicadores de unidimensionalidade (Ferrando y Lorenzo-Seva, 2018) (UniCo = 0,883 (IC95% = 0,857 - 0,939) e ECV = 0,745 (IC95% = 0,707 - 0,798)), que sugeriram que o modelo não pode ser considerado unifatorial, reforçando sua bidimensionalidade. Os detalhes são apresentados na Tabela 1.
Nota: Carga fatorial mínima (0,40); F1 = Dificuldade de Execução; e F2 = Conduta de Evitação; h2 = Comunalidade.
Como demonstra a Tabela 1, a ECAE apresentou evidências de validade interna satisfatória. Ressalta-se que foram eliminados três itens da medida, sendo os itens 10 e item 11 eliminados por não alcançarem a carga fatorial mínima estabelecida (0,40), para que o item pertencesse ao fator; ponto de corte que é considerado minimamente aceitável para amostras entre 200 a 250 participantes (Hair et al., 2019). além do item 06, que teoricamente pertence ao fator conduta de evitação, mas apresentou uma saturação elevada (0,549) no fator Dificuldade de Execução, optando por eliminá-lo. Assim, a medida reuniu 11 itens, que foram distribuídos entre dois fatores.
Fator I. Dificuldade de Execução, reuniu seis itens (02,03, 05, 09, 12, 14), apresentando um valor próprio igual a 4,50, que explicou 32,14% da variância total. Os itens que o compuseram apresentaram cargas fatoriais variando de 0,447 (Item 02, “Respondo as perguntas da avaliação de uma forma pouco clara”) a 0,782 (Item 14, “Por responder apressadamente, cometo erros”). Além disso, a consistência interna, avaliada pelo Alfa de Cronbach e Ômega de McDonald (ω) foi considerada (α = 0,85 e ω = 0,88).
Fator II. Conduta de evitação, que ficou composto por cinco itens (01, 04, 07, 08, 13), com valor próprio igual a 1,70, explicou 44,30% da variância total, com cargas fatoriais variando entre 0,443 (Item 13, “Sinto-me tão mal se não respondo adequadamente a avaliação, que digo ao professor que não irei continuar”) e 0,809 (Item 01, “Me preparo para responder a avaliação, mas quando chega o dia da avaliação eu não apareço”). Ademais, a consistência interna foi considerada adequada (α = 0,83 e ω = 0,91).
Estudo 2. Comprovação da Estrutura Fatorial e Evidências de Validade Convergente da Escala Comportamental de Ansiedade aos Exames (ECAE)
Considerando a estrutura interna bifatorial da ECAE, com 11 itens do estudo 1, procedeu-se uma análise fatorial confirmatória (AFC), com estimador Weighted Least Square Mean and Variance Adjusted (WLSMV), que apresentou ajuste de modelo adequado (χ2/ gl = 1,36, CFI = 0,98; TLI = 0,98; RMSEA = 0,04 (IC90% = 0,01 - 0,106 e p > 0,05)). Os indicadores de consistência interna foram adequados nos dois fatores: dificuldade de execução (α = 0,85, ω = 0,90) e conduta de evitação (α = 0,84, ω = 0,87).
Finalmente, foram reunidas evidências de validade convergente para medidas externas. Foi considerado um modelo (Figura 1) composto por três variáveis latentes: duas representando os fatores da ECAE, a saber: dificuldade de execução (reunindo 6 itens), e conduta de evitação (com 5 itens), além da ansiedade cognitiva de provas, com os 16 itens da CTAS formando um fator geral. Foi observado que as variáveis latentes da conduta de ansiedade apresentaram pesos de regressão como esperado, associando-se positivamente com a ansiedade cognitiva de provas: dificuldade de execução (λ = 0,63 p < 0,001) e conduta de evitação (λ = 0,41; p < 0,001), apresentando os seguintes índices de ajuste (CFI = 0,99; TLI = 0,99; RMSEA = 0,010 (IC90% = 0,001/ 0,026)).
Discussão
A presente pesquisa tem como objetivo principal adaptar a Escala Comportamental de Ansiedade aos Exames (ECAE) (Furlan, 2013) para o português brasileiro, reunindo evidências relacionadas a suas propriedades. Especificamente, foram verificadas suas evidências de validade baseados na estrutura interna (análise dos itens e estrutura fatorial e validade convergente (ansiedade cognitiva de provas), além da fidedignidade da medida (alfa de Cronbach e ômega de McDonald).
No estudo 1, procedeu-se a análise fatorial exploratória, que permitiu reunir evidências que atestaram a qualidade métrica da medida (validade fatorial e precisão), com índices superiores aos indicados pela literatura (Pasquali; 2016; Tabachnick y Fidell, 2013). Ressalta-se que três itens da medida foram eliminados, com os itens 10 e item 11 eliminados por não alcançarem a carga fatorial mínima sugerida (0,40) (Hair et al., 2019; Pasquali, 2016). Além disso, deve-se ter em conta que o item 06, que teoricamente corresponde ao fator conduta de evitação, apresentou uma elevada carga fatorial (0,55) no fator dificuldade de execução. Assim, devido ao item apresentar uma semântica contraditória ao fator que havia agrupado e considerando a natureza ortogonal da rotação, que assumem que os fatores extraídos são independentes e não apresentam correlações entre si (Damásio, 2012), adotada por Furlan (2013) e replicada no presente estudo, optou-se por excluí-lo das análises subsequentes.
No estudo 2, foi realizada uma Análise Fatorial Confirmatória (AFC), que corroborou a adequação da estrutura bidimensional, pois seus índices de ajuste foram considerados adequados (CFI e TLI) (Hair et al., 2019). Também foi verificada, nos dois estudos, a confiabilidade (precisão) da medida, que foi avaliada pelos indicadores de Alfa de Cronbach e o ômega de McDonald, que apresentaram valores que figuram acima do ponto de corte indicado (≤0,70) (Hair et al., 2019), sendo considerados meritórios.
Esses resultados reforçam que a estrutura bifatorial é a mais plausível, como já evidenciada em pesquisas realizadas em outros países sul-americanos, como o colombiano (Furlan, 2013), argentino (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018) e venezuelano (Lange et al., 2022). Para o contexto brasileiro, a ECAE ficou composta por 11 itens, que foram distribuídos entre os dois fatores (F1 = Dificuldade de Execução; e F2 = Conduta de Evitação), atestando evidências referente a sua estrutura interna da ECAE.
Ademais, foram reunidas evidências de validade convergente. Os resultados evidenciaram que os fatores da ECAE estavam positivamente relacionados com a ansiedade cognitiva de provas, como sugerido em pesquisa prévia (Furlan, 2013). Na presente pesquisa os valores superiores evidenciaram relações positivas superiores a 0,40, sugerindo evidências de validade convergente (Nunes y Primi, 2010).
Apesar dos resultados promissores, está pesquisa não se isenta de limitações. Por exemplo, cita-se o caráter amostral, que foi transversal, recolhida por conveniência (não probabilística), contando com a colaboração de universitários que aceitaram responder a pesquisa. Assim, entende-se que os resultados não refletem a realidade para além da amostra considerada. Entretanto, cabe ressaltar que esta pesquisa não objetivou generalizar resultados, mas apresentar uma medida que apresentasse boas qualidades psicométricas sobre a conduta de ansiedade frente a avaliações acadêmicas. Assim, apesar do esforço de pesquisadores brasileiros para entender os mecanismos associados a ansiedade de provas (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022; Silva et al., 2023).
Além disso, outra limitação está relacionada a medida de autorrelato, que apesar de ser amplamente utilizadas em pesquisas que envolvem variáveis psicossociais, que incluem o contexto universitário (Silva et al., 2020), tende a apresentar desvantagens, que são oriundas da interferência da desejabilidade social. Isso pode fazer com que o respondente altere a suas respostas detrimento da autopromoção (Medeiros et al., 2020), uma vez que condutas relacionadas a sintomas ansiosos em contextos avaliativos não são desejáveis entre os estudantes universitários, pois faz com que os indivíduos apresentem um baixo desempenho, que pode resultar em atrasos no curso acadêmico, ocasionadas por reprovações (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018).
Nesse interim, reconhecendo as possíveis limitações e considerando a possibilidade de serem realizadas pesquisas adicionais sobre a temática, sugere-se que que sejam levadas em consideração algumas características. Por exemplo, recomenda-se que estudos futuros alcancem amostras maiores e mais heterogêneas, abrangendo um número maior de estados brasileiros. Dito isto, uma vez que a presente pesquisa se limitou a recolha dos dados apenas a duas instituições públicas de uma cidade do interior do Piauí - Brasil, seria interessante verificar se a estrutura bifatorial da ECAE se mantém invariante em diferentes contextos, sendo pertinente considerar a Análise Fatorial Confirmatória Multigrupo (AFCMG). A AFCMG possibilitaria avaliar a invariância da estrutura e dos parâmetros psicométricos da ACAE instrumento diferentes grupos (e.g., instituições públicas e particulares; diferentes estados e cidades).
Além disso, seria igualmente interessante reunir evidencias adicionais de validade externa da medida com diferentes construtos. Por exemplo, perfeccionismo desadaptativo e a procrastinação acadêmica, que estão relacionados positivamente a condutas de ansiedade em provas (Furlan y Martínez -Santos, 2023; Silva et al., 2023). Ademais, quando se aborda especificamente as condutas de ansiedade, observam-se alguns antecedentes, como a vergonha e ansiedade cognitiva de provas (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018). Sabe-se, por exemplo, que a ansiedade avaliativa está relacionada a fatores situacionais, como baixo autoconceito, interferindo na eficiência em reter de conteúdos durante a preparação para uma prova (Maier, Schaitz, Kröner, Connemann, y Sosic-Vasic, 2020).
Além disso, estudos demonstram a influência de variáveis sociodemográficas. Neste caso, verifica-se que mulheres e pessoas mais jovens têm maiores chances de experimentarem ansiedade em contexto avaliativo, apresentarem menor desempenho acadêmico e exibirem comportamentos de evitação (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018 Silva et al., 2022). Assim, pode-se considerar a ECAE para auxiliar os profissionais em propostas interventivas de alunos com elevada ansiedade de provas, com propostas que visem melhorar a regulação emocional dos universitários, utilizando-se de técnicas da Terapia Cognitiva Comportamental (TCC), para promover recursos e estratégias de enfrentamento da ansiedade de provas (Furlan y Martínez -Santos, 2023).
Considerações finais
Em síntese, os resultados apontam evidências psicométricas satisfatórias para a adaptação da Escala Comportamental de Ansiedade aos Exames (ECAE) no contexto brasileiro, sendo corroborada a estrutura bidimensional da ECAE, composta pelos fatores Dificuldade de Execução e Conduta de Evitação, distribuídos em 11 itens, configura-se como uma medida curta, focada nas manifestações comportamentais de indivíduos com alta AE. Além disso, a ECAE apresentou validade convergente, com a ansiedade cognitiva de provas. Esses achados indicam que a ECAE pode ser uma ferramenta confiável para avaliar a ansiedade relacionada a exames em estudantes brasileiros.
Dito isso, reforça-se que o instrumento pode ajudar na compreensão mais detalhada dos mecanismos associados a temática, como características desadaptativas relacionadas ao perfeccionismo, ou a como as estratégias de enfrentamento podem auxiliar na redução da AE (Furlan, y Martínez- Santos, 2023). Ademais, seria igualmente interessante aumentar a rede nomológica de possíveis variáveis relacionadas ao tema, como por exemplo, o fenômeno do impostor, que tem se demonstrado relevante na explicação de sintomas negativos em contextos avaliativos que envolvem desempenho acadêmico, como o acadêmico universitário (Silva, Araújo et al., 2023). Essas evidências poderiam auxiliar na elaboração de programas interventivos, tanto em âmbito educacional como clínico (Furlan y Sánchez-Rosas, 2018).