1. Introdução
Na aquisição do espanhol, uma das dificuldades encontradas por estudantes brasileiros é a produção da vogal baixa quando esta se encontra seguida de consoante nasal na coda da sílaba. Comumente, em palavras do espanhol como campo e fango, nas quais as vogais seguidas de coda nasal são produzidas como vogais orais (a) por falantes nativos do espanhol, os aprendizes brasileiros de espanhol nasalizam tais vogais, produzindo-as como (ɐ̃).
No espanhol, a nasalização tem natureza alofônica e manifesta-se foneticamente por condicionamento de duas ambiências:
(a) quando a vogal está entre duas consoantes nasais, estando a primeira em onset e a segunda pertencendo à coda da mesma sílaba (sequência .NVN. como em mancha) ou ao onset da sílaba seguinte (sequência .NV.N como em maña);
(b) quando a vogal é precedida por uma pausa e seguida por nasal na coda silábica (sequência //VN. como em hampa).
Nos demais contextos, conforme Quilis (1999), Alcina Franch e Blecua (2001) e Navarro Tomás (1918)(2004), a vogal é realizada como oral. Diferentemente do espanhol, no português brasileiro (doravante PB), seguindo-se Bisol (2002), a nasalidade vocálica apresenta duplo status: um fonológico, que é caracterizado pelo grupo VN tautossilábico (VN. como em tango, pampa), e outro fonético, caracterizado pelo grupo VN heterossilábico (V.N como em cama, Ana).
Resultando sempre da assimilação da propriedade nasal da consoante seguinte, a nasalidade vocálica, no PB, tem manifestação fonética toda vez em que ocorra o grupo VN (seja tautossilábico ou heterossilábico), mostrando, portanto, emprego mais abrangente, se comparado ao espanhol.
Tendo em vista as diferenças existentes entre o PB e o espanhol quanto à nasalização vocálica, mais especificamente quanto àquela que atinge o grupo VN tautossilábico, e levando em conta que o grupo investigado tem como língua materna o PB e, como língua estrangeira, o espanhol, o presente estudo tem os seguintes propósitos:
a)caracterizar acusticamente, na produção de estudantes brasileiros de um Curso de Licenciatura em Letras Português-Espanhol e de falantes nativos do espanhol do Uruguai, a manifestação fonética da vogal /a/ do espanhol, em contextos em que ela seria produzida como oral e em contextos em que ela seria produzida como nasal;
b)comparar acusticamente a manifestação fonética da vogal /a/ do espanhol em contexto nasal produzida por estudantes brasileiros de espanhol com a manifestação fonética da vogal /a/ do PB;
c)verificar se os valores das três primeiras ressonâncias (F1, F2 e F3), bem como da duração absoluta da manifestação fonética da vogal /a/ em contexto oral e em contexto nasal, em produções dos estudantes brasileiros de espanhol, assemelham-se aos de falantes nativos de espanhol;
d)verificar se a língua materna dos estudantes brasileiros influencia na produção da vogal baixa do espanhol em contexto nasal.
Este estudo justifica-se pela existência de poucas pesquisas que tratam da nasalização vocálica no espanhol (Bailey, 2013; Rodrigues-Alves, 2014; Dias-Cavalheiro, 2016); dentre as citadas, somente a de Dias-Cavalheiro (2016) analisa particularmente a vogal baixa em contexto oral e nasal na produção de brasileiros aprendizes de espanhol.
Além disso, o fenômeno da nasalização da vogal baixa é bastante recorrente na produção dos aprendizes brasileiros, inclusive nos níveis mais avançados de estudo do espanhol. Desse modo, os resultados deste trabalho podem auxiliar na prática docente.
Neste artigo, em um primeiro momento, descrevem-se alguns resultados acústicos de pesquisas sobre a vogal /a/ oral e sua correlata nasal do PB e do espanhol.
Na sequência, apresenta-se a metodologia da pesquisa e, por fim, trazem-se os resultados obtidos e as conclusões do estudo.
2. Estudos acústicos sobre a manifestação fonética das vogais /a/ e /aN/ do português brasileiro e do espanhol
De acordo com a literatura, articulatoriamente, vogais orais e vogais nasais2 diferem porque, nas primeiras, o ar passa exclusivamente pela cavidade oral, sem qualquer obstáculo.
Na produção de vogais nasais, há o abaixamento do véu palatino, que resulta no acoplamento da cavidade oral com a cavidade nasal e, consequentemente, na passagem do ar por ambas as cavidades, do que decorre a nasalidade.
O resultado desse acoplamento de cavidades provoca mudanças com relação à caracterização acústica da vogal nasal em contraposição à vogal oral. O acoplamento das cavidades na produção da vogal nasal, segundo Cagliari (1977), Sousa (1994), Seara (2000), faz com que surjam formantes nasais, antirressonâncias (antiformantes), aumento da largura-de-banda dos formantes, bem como a alteração da amplitude dos formantes. Essas alterações provocam mudanças nos formantes e na duração da vogal nasal. Os formantes nasais, de acordo com Seara (2000), são pistas acústicas secundárias que servem também para caracterizar as vogais nasais.
Conforme Delattre (1954 apudSeara, 2000), o primeiro formante de vogais nasais é um formante nasal (FN1) e apresenta, para todas as vogais nasais, frequências muito próximas, em torno de 250Hz. E a presença de FN1 nas vogais nasais e nasalizadas leva ao abaixamento significativo de F1.
Considerando o foco desta pesquisa, serão apresentados, na próxima seção, valores médios de referência de F1, F2 e F3, bem como de duração da manifestação fonética da vogal /a/ e de /aN/ do PB, retiradas de Cagliari (1977), Moraes e Wetzels (1992), Sousa (1994), Seara (2000), Campos (2009), Souza (2013) e Santos (2013).
As constatações desses pesquisadores referentes às mudanças formânticas e de duração serão retomadas na análise dos dados, tanto ao se tratar de vogais do PB, quanto do espanhol.
2.1. Estudos acústicos sobre a vogal baixa, oral e nasal, em português brasileiro
Estudos realizados com o suporte da Fonética Acústica já explicitaram as propriedades acústicas das manifestações fonéticas que representam as vogais /a/ e /aN/ no PB.
Os valores encontrados para F1, F2 e F3 são mostrados na Tabela 1, considerando-se o sexo do falante e as regiões brasileiras de sua proveniência3.
De acordo com Cagliari (1977), Sousa (1994), Seara (2000), Souza (2013) e Santos (2013), o valor de F1 da vogal nasal diminui em comparação ao da vogal oral. Essa diminuição representa uma elevação vocálica motivada pela propriedade nasal.
Quanto aos valores de F2, Sousa (1994), Seara (2000), Santos (2013) e Souza (2013), nos dados dos informantes do sexo masculino, não encontram diferenças significativas entre a vogal oral e nasal.
Todavia, Santos (2013) e Souza (2013) verificam em seus estudos que, nos dados das mulheres, o F2 da vogal nasal diminui em comparação com a vogal oral.
Com relação aos valores de F3, conforme Seara (2000), tanto a vogal oral quanto a vogal nasal não revelam diferenças; no entanto, para Sousa (1994) e Souza (2013), o valor médio de F3 é maior para a vogal nasal se comparado à vogal oral.
Ainda, segundo Sousa (1994) e Seara (2000), diferentemente de vogais orais que apresentam apenas um momento acústico, vogais nasais podem ser constituídas de três momentos (um momento oral seguido por um momento nasal com o murmúrio sobreposto à vogal e um momento de murmúrio nasal) ou dois momentos acústicos (momento nasal seguido de murmúrio nasal ou momento oral seguido de murmúrio nasal).
Na Tabela 2, são apresentados valores de referência da duração da vogal /a/ oral e de sua contraparte nasal em posição tônica no PB, retirados de Moraes e Wetzels (1992), Sousa (1994), Seara (2000), Campos (2009) e Santos (2013), considerando-se o sexo do falante e as regiões brasileiras de sua proveniência.
Segundo Moraes e Wetzels (1992), Sousa (1994), Seara (2000), Campos (2009) e Santos (2013), as vogais nasais, no PB, apresentam duração maior do que a sua correspondente oral (veja-se Tabela 2). Os estudos também indicam que o murmúrio nasal tem papel relevante no que tange à duração de vogais nasais. Segundo Seara (2000).
A vogal nasal sem o murmúrio apresentou-se sem diferenças significativas em relação à duração da vogal oral. Somente para a vogal nasal (ɐ), observamos diferenças significativas entre a duração média da vogal sem murmúrio e a duração média da vogal oral, ficando a vogal nasal sem murmúrio menor do que a sua contraparte oral. (Seara, 2000: 123)
Diferentemente dos estudos citados que mediram a duração da vogal nasal com o murmúrio nasal, Campos (2009) não considerou o murmúrio nasal nas medidas de duração das vogais nasais. Ainda assim, segundo a autora, as vogais nasais apresentaram maior duração em comparação à sua contraparte oral.
Salienta-se, no entanto, que, aparentemente, não foram realizadas medidas de estatística inferencial que demonstrassem a significância desse comportamento.
Conforme pode ser observado nos estudos resumidos nas Tabelas 1 e 2, todos os autores evidenciam os parâmetros F1 (com diminuição na vogal nasal em relação à oral) e duração (com aumento da duração na vogal nasal em relação à oral), como sendo os mais relevantes quando se comparam vogais orais e nasais no PB. Desse modo, será então verificado se os resultados da análise dos dados da presente pesquisa ratificam ou não os resultados apresentados pela literatura, relembrando que, apesar de o foco do presente estudo ser o espanhol, a língua materna dos aprendizes é o PB.
2.2. Estudos acústicos sobre a vogal baixa, oral e nasal, em espanhol
No espanhol, considerando que a nasalidade vocálica é um fenômeno de natureza alofônica, a maior parte dos estudos acústicos sobre vogais centram-se nas vogais orais. No entanto, nos estudos de Bailey (2013)9 e Rodrigues-Alves (2014)10 foram encontrados valores referentes à vogal /aN/ para o espanhol.
Na Tabela 3, são apresentados resultados de pesquisas sobre a vogal baixa, oral e nasal, em espanhol. Os resultados de F1, F2 e F3 são apresentados pelo sexo e pelos países hispânicos nos quais os estudos foram feitos. Conforme pode ser observado na Tabela 3, poucas são as investigações que apresentam valores de referência para /aN/.
Segundo Bailey (2013) e Rodrigues-Alves (2014), os valores de F1 da vogal nasal em relação à vogal oral no espanhol não apresentam as relações encontradas entre vogal oral e nasal no PB. As pesquisas sobre dados do espanhol, exibidas na Tabela 3, concluem que o valor do F1 da vogal nasal diminui em comparação ao da vogal oral, porém aparentemente a distância entre esses valores de F1 não é a mesma apresentada para o PB. Essa pode ser uma particularidade da vogal nasal no espanhol.
Ainda, segundo Bailey (2013), em espanhol, o grau de nasalidade vocálica é menor do que em PB, considerando todas as vogais, com exceção da vogal alta anterior, que apresenta maior grau. Rodrigues-Alves (2014:93) afirma que, embora nem todas as palavras contempladas na sua pesquisa tenham contexto indicado pela literatura como condicionantes da nasalização, ocorre nasalização vocálica em espanhol também nos contextos não indicados como gatilho para o fenômeno. Além disso, ao serem comparados o PB e o espanhol, a autora ratifica os achados de Bailey (2013), afirmando que, “no espanhol, há uma nasalidade em menor grau do que em português chegando ao ponto de poder ser considerada oral se comparada nas duas línguas”.
Na Tabela 4, são expressos alguns valores de referência de duração absoluta da vogal baixa do espanhol, considerando-se o sexo dos falantes e os países hispânicos nos quais os estudos foram feitos.
Como os estudos de duração feitos no espanhol, apresentados na Tabela 4, se debruçaram apenas sobre a vogal em ambiente oral, não há o registro de resultados de duração da vogal baixa nasal.
Tendo em vista que foram encontrados poucos trabalhos que tratam de vogais nasais do espanhol, coletou-se, para o presente estudo, uma amostra de dados da vogal baixa oral e nasal da variante uruguaia (veja-se Seção 3).
Essa amostra servirá de base, juntamente com o estudo de Bailey (2013) e Rodrigues-Alves (2014), para a comparação com os dados de fala dos aprendizes brasileiros de espanhol.
Considerando que o foco de interesse do presente artigo é a produção de espanhol por brasileiros, na seção subsequente, são apresentados valores de referência de F1, F2 e F3, bem como de duração, para a vogal baixa do espanhol, obtidos em um estudo centrado na produção linguística de brasileiros aprendizes de espanhol.
2.3. Estudo acústico sobre as manifestações fonéticas das vogais /a/ e /aN/ em espanhol, produzidas por aprendizes de espanhol, falantes nativos de português brasileiro
Dias-Cavalheiro (2016) investigou a aquisição da vogal /a/ do espanhol, em contexto oral e nasal, por aprendizes brasileiros, estudantes do Curso de Letras Português-Espanhol, de uma universidade do sul do Brasil. O estudo comparou dados de três grupos: um falante monolíngue de PB, um nativo de espanhol e seis estudantes de graduação (três do segundo semestre e três do quarto semestre do curso).
Na Tabela 5, são sintetizados os resultados do estudo de Dias-Cavalheiro (2016), considerando que as estudantes são todas mulheres brasileiras aprendizes de espanhol16 e que os dados estão classificados por nível de proficiência no espanhol.
Os resultados da pesquisa de Dias-Cavalheiro (2016), mostrados na Tabela 5, apontam para uma diminuição de F1 para a vogal nasal tanto nos dados dos aprendizes de nível intermediário quanto no nível avançado, em consonância com o que os estudos descritos sobre o PB (veja-se Tabela 1) e de forma diferente do resultado registrado para o espanhol (veja-se Tabela 3). Segundo a autora, com relação aos valores médios de F2, “parece não haver relevância desta medida para a caracterização da presença ou ausência da nasalidade” (Dias-Cavalheiro, 2016, p. 84), não permitindo estabelecer diferenças entre as vogais para os dois níveis estudados e, nesse caso, aproximando-se mais dos valores mostrados por falantes de espanhol do que por falantes do português brasileiro (vejam-se Tabelas 1 e 3).
Dias-Cavalheiro (2016) incluiu a variável ‘palavras cognatas e não cognatas’ no português e no espanhol e, ao se observarem os valores de F3, foi possível verificar que, no caso das palavras cognatas, o valor médio é maior para a vogal nasal do que para a oral, mas, no caso das não cognatas, o resultado se inverte, ou seja, há uma redução de F3 para a vogal nasal. Como já havia sido observado, em relação a F2, um comportamento mais similar ao nativo de espanhol, o mesmo foi observado em relação a F3.
Assim a autora conclui que os valores mostrados pelos aprendizes em seu estudo apresentam índices levemente mais próximos do nativo de espanhol do que do nativo de PB.
Com relação à duração, o estudo indica que a vogal nasal é mais longa do que a oral em palavras cognatas em ambos os níveis: Intermediário e Avançado. Em palavras não cognatas, essa relação se inverte, passando a vogal oral a possuir maior duração.
Apresentados alguns valores de referência de F1, F2, F3, e de duração, para a vogal baixa do PB e do espanhol falado por nativos e também do espanhol falado por brasileiros, passa-se à descrição da metodologia empregada na presente pesquisa sobre produção acústica referente à vogal /a/ do espanhol em contexto nasal.
3. Metodologia
O corpus usado para a presente pesquisa foi, inicialmente, coletado para um estudo sobre percepção. Ao ser realizada a coleta de dados, o número de sujeitos do sexo masculino que puderam participar da pesquisa foi pequeno e, por essa razão, optou-se analisar o corpus apenas obtido com mulheres.
Assim, participaram da pesquisa seis mulheres, falantes do PB, nascidas no Rio Grande do Sul, com idades entre 18 e 24 anos (média de idade de 21 anos; desvio padrão de 2,66), estudantes universitárias do primeiro semestre (nível inicial) do Curso de Letras Português-Espanhol, da Universidade Federal do Rio Grande, em Rio Grande (RS), no Brasil.
E também foram gravadas seis mulheres, falantes de espanhol do Uruguai, todas nascidas e residentes em Montevidéu e Maldonado, com idades entre 18 e 22 anos (média de idade de 20 anos; desvio padrão de 1,37), estudantes universitárias da Facultad de Comunicación e Información da Universidad de la República, em Montevidéu, no Uruguai.
As gravações dos dados produzidos pelas 12 informantes foram feitas em cabine com tratamento acústico, com uma taxa de amostragem de 44.100Hz, 16 bits e Mono e esses dados foram salvos em arquivos .wav. As brasileiras foram gravadas na cidade de Rio Grande, no Brasil, e as uruguaias, em Montevidéu, no Uruguai.
A amostra17 foi constituída de 15 palavras dissilábicas contendo a vogal-alvo em posição tônica em sílabas com estrutura CV, no caso da vogal oral, e com estruturas CVC e VC, no caso da vogal /a/ diante de nasal. Segundo a literatura, o som-alvo poderia ser produzido como oral (ex.: campo) ou como nasal (ex.: manco; hampa).
Os sujeitos da pesquisa leram as 15 palavras do espanhol, apresentadas nas frases-veículo ‘Diga_____otra vez’ e ‘_____es una palabra del español’18, em Slides no Power Point, com um intervalo de quatro segundos entre a apresentação de uma frase e outra. Coletaram-se duas produções de cada palavra por cada sujeito e, como os sujeitos foram todas mulheres, não houve normalização dos dados, totalizando 360 dados (15 palavras x 2 repetições x 12 informantes).
Na Figura 1, são apresentadas as palavras do espanhol que constituíram o instrumento proposto para a coleta dos dados do presente estudo.
Conforme pode ser observado na Figura 1, a vogal /a/ em (1) foi precedida por oclusivas e seguida por oclusivas, fricativas e africadas; a vogal /a/ em (2) e (3), foi precedida de oclusivas e fricativas, nasais ou pausa, e foi seguida de oclusivas e fricativas. Como se pode verificar, os contextos precedente e seguinte à vogal-alvo não foram homogeneizados para que se pudesse garantir os ambientes de nasalização da vogal no espanhol.
Os dados gravados foram segmentados e etiquetados manualmente, através do Software Praat, versão 6.0.39 (Boersma e Weenink, 2018), por meio de TextGrids, conforme exemplo mostrado na Figura 2.
Na Figura 2, pode-se verificar que há quatro camadas de etiquetagem (tiers): a primeira para o segmento em análise, a segunda para a sílaba, a terceira para a palavra e, por fim, a quarta para a frase-veículo. Na camada do segmento, a vogal apresenta duas etiquetagens: uma relativa à vogal propriamente dita (VN), e outra que diz respeito ao murmúrio nasal (M). Como não foi possível segmentar o momento oral e o momento nasal da vogal em todos os dados, optou-se por segmentar a vogal apenas em dois momentos acústicos (vogal propriamente dita e murmúrio). No entanto, conforme será esclarecido na análise dos dados, através do uso de um Script para coletar os valores dos formantes e da duração, foi possível observar, em alguns casos, três momentos acústicos referente à vogal /aN/, quando nasalizada.
A observação dos momentos acústicos na produção dos segmentos-alvo foi realizada a partir da observação dos movimentos das trajetórias dos formantes verificados com base nos valores das frequências desses formantes e em valores frequenciais que remetessem à presença ou ausência de formantes nasais, como o abaixamento de F1. Após a segmentação dos dados, para a obtenção dos valores de F1, F2 e F3 e da duração, foi utilizado um script que automatiza a coleta desses valores19.
Esse script coleta cinco pontos equidistantes na região etiquetada concernente ao som-alvo, ou seja, ponto 1 (início), pontos 2, 3 e 4 (meio) e ponto 5 (fim do segmento). Para esta pesquisa, foi selecionado o ponto 3, tendo em vista que o mesmo se encontra na região medial do segmento, que é, em geral, a mais estável para a coleta de dados acústicos.
Alguns dados foram coletados nos pontos 2 ou 4 por conta de alterações acústicas (ruídos ou cliques) que inviabilizavam a coleta adequada de valores no ponto 3. Com o uso do mesmo script, obteve-se a duração do segmento e da sílaba. Após a obtenção desses valores, coletou-se a duração relativa (DR), a fim de se observar o percentual que o segmento em análise ocupa em relação à sílaba, a partir do seguinte cálculo:
DR = (duração do segmento-alvo/duração da sílaba em que o segmento-alvo se encontra)x100
A descrição dos resultados também incluiu uma análise estatística com o uso do Software SPSS, versão 21.0. Inicialmente, observou-se se os dados da pesquisa atendiam ao pressuposto da normalidade, aplicando os testes Kolmogorov-Smirnov e Shapiro-Wilks. Em sendo a distribuição normal, na análise intragrupo, foram aplicados os testes T para amostras emparelhadas e Anova para medidas repetidas e, na comparação entre os grupos, o teste T para amostras independentes.
No caso de distribuição não normal, foi aplicado o Teste Wilcoxon na análise intragrupo e, na comparação entre os grupos, o teste Mann-Whitney (U). O nível de significância (p) é de 0,05, ou seja, com valores de p ( .05, os resultados das diferenças são significativos e tem-se apenas 5% de chance de que esse resultado seja devido ao acaso.
Na seção a seguir são apresentados as análises e os resultados obtidos levando-se em conta, inicialmente, os três primeiros formantes e, depois, os dados referentes à duração da vogal baixa.
4. Análise dos resultados
Os resultados são apresentados e discutidos inicialmente por meio de uma análise dos três primeiros formantes da vogal baixa oral e da vogal em contexto nasal de dados de falantes nativos do espanhol do Uruguai e de brasileiros aprendizes de espanhol. Posteriormente, são expostas as medidas de duração absoluta e relativa das duas vogais, oral e nasal, nos dados dos falantes nativos uruguaios e de brasileiros aprendizes de espanhol. Os achados da presente pesquisa são comparados com dados registrados na literatura sobre o PB e o espanhol.
4.1. Frequências de F1, F2 e F3 das vogais /a/ e /aN/
Na Tabela 6, apresentam-se os valores mínimos, máximos, médios e o desvio padrão de F1, F2 e F3 das produções acústicas relativas à vogal /a/ e à vogal /aN/, evidenciados nos dados de seis falantes nativas de espanhol do Uruguai do sexo feminino, participantes da pesquisa.
Na Tabela 6, os valores médios de F1 de produções acústicas referentes às vogais /a/ e /aN/ são bastante semelhantes e, pelo Teste T para amostras emparelhadas, não há diferenças significativas entre essas produções (t(5) = -0,491, p=0,644). Esse resultado indica que vogal oral /a/ e a vogal /a/ seguida de consoante nasal têm uma altura muito semelhante (763Hz e 767Hz, respectivamente). Assim, na produção acústica relativa a /aN/, parece não haver abaixamento do véu palatino, o que poderia significar que as uruguaias que participaram do presente estudo não nasalizam essa vogal. Esse resultado vai de encontro ao estudo de Bailey (2013), no qual é observado um abaixamento de F1 para a produção relativa a /aN/ se comparada com /a/, ou seja, 638Hz e 809Hz, respectivamente. No entanto, Bailey (2013) investiga o espanhol falado nas Ilhas Canárias, República Dominicana, Bolívia e Espanha, variedades diferentes, portanto, da analisada no presente estudo, e se baseia na produção de fala de apenas um sujeito de cada região.
Com relação a F2, na Tabela 6, observamos que as produções acústicas referentes à vogal /a/ apresenta valores médios maiores do que as produções referentes à vogal /aN/ e essa diferença é significativa (t(5) = 3,083, p=0,027). O comportamento dessas vogais é diferente daquele observado para o PB (Tabela 1) e também para o espanhol (Tabela 3). Esse fato pode estar indicando que a diferença entre essas vogais estaria na anterioridade/posterioridade da língua e não na altura. Como se pode observar na Tabela 6, o F2 tem média de 1641Hz, para a produção relativa à vogal /a/, e de 1543Hz, para /aN/.
Quanto aos valores referentes a F3, os resultados indicam não haver diferenças significativas entre essas vogais (t(5) = - 0,810, p=0,455), sendo que as produções referentes às vogais /a/ e /aN/ apresentam valores de F3 próximos de 3000Hz.
A Tabela 7 contém os valores mínimos, máximos, médios e desvio padrão dos três primeiros formantes de produções acústicas referentes às vogais /a/ e /aN/ retirados dos dados das seis brasileiras aprendizes de espanhol que participaram do estudo.
Na Tabela 7, observa-se que os valores médios de F1 da produção relativa à vogal /aN/ são significativamente mais baixos do que os da vogal /a/, nos dados das brasileiras aprendizes de espanhol, o que é corroborado pelo teste Wilcoxon (Z = -2,201, p=0,028). Esse resultado vem ao encontro dos resultados de Cagliari (1977), Sousa (1994), Seara (2000), Souza (2013) e Santos (2013), na análise de dados de falantes nativos do PB, expressos na Tabela 1, e também ao encontro dos dados dos aprendizes de espanhol, apresentados em Dias-Cavalheiro (2016), conforme expresso na Tabela 5.
Quanto ao F1, portanto, os aprendizes mostram maior distanciamento do espanhol, já que, pelos dados resumidos na Tabela 3, para os falantes nativos desta língua, o F1 da vogal nasal pode não diminuir em comparação com o da vogal oral. Esse resultado também é confirmado pelos registros trazidos na Tabela 6.
Com relação a F2, os resultados indicam que a vogal oral apresenta frequência significativamente mais alta em comparação com a vogal nasal (t(5) = 4,507, p=0,006). Os valores médios de F2 apresentados estão mais próximos dos dados do PB (veja-se Tabela 1) em comparação com o espanhol (veja-se Tabela 3). Esse resultado vai de encontro ao observado em Dias-Cavalheiro (2016).
Os valores de F3 indicam também um aumento significativo na produção relativa à vogal /aN/ comparada à vogal oral /a/ (t(5) = -3,294, p=0,024), corroborando os resultados de Souza (2013), para o PB, e os de Dias-Cavalheiro (2016), no que tange à aquisição do espanhol por brasileiros.
Ao serem comparados os dados das Tabelas 6 e 7, relativos às produções referentes às vogais /a/ e /aN/ dos nativos de espanhol e dos aprendizes desse idioma, é possível verificar que, com relação às médias de F1, há uma diferença com relação à altura da vogal /a/, visto que as aprendizes brasileiras apresentam média de F1 de 917Hz, enquanto as uruguaias apresentam F1 = 763Hz (u= 5,000, p=0,037).
Considerando a produção referente à vogal /aN/, os valores de F1 das aprendizes se reduzem, indicando o abaixamento do véu palatino e, consequentemente, a nasalização vocálica (F1= 695Hz), enquanto, nos dados das uruguaias, os valores se mantêm bastante próximos ao da vogal /a/ (F1=767Hz), apontando para a produção sem abaixamento do véu palatino, ou seja, uma vogal oral. Os testes estatísticos indicam uma diferença significativa na produção da vogal /aN/ comparando-se os valores de F1 das aprendizes e das nativas de espanhol (t(10)= 2,197, p=0,053). No que concerne ao F2, não há diferenças significativas com relação à produção da vogal /a/ nos dados das aprendizes brasileiras e das uruguaias (t(10)= -1,257, p=0,237). Nesse sentido, a vogal oral parece ser semelhante em relação à posição horizontal da língua (F2= 1698Hz aprendizes; F2= 1641Hz uruguaias). Considerando os valores de F2 da produção acústica relativa a /aN/, é possível observar que os valores de F2 das aprendizes e das uruguaias são bastante próximos (F2= 1534Hz aprendizes; F2= 1543Hz uruguaias), não havendo diferenças estatísticas relevantes (t(10)= 0,153, p=0,881). No entanto, levando-se em conta apenas os dados das uruguaias com relação a F2, pode-se observar uma diminuição significativa desses valores médios na produção relativa à vogal /aN/ (1543 Hz) quando comparada à da vogal /a/ (1641 Hz) (t(5)= 3,083, p=0,027), o que indica uma diferença entre essas vogais, ou seja, no espanhol do Uruguai, a vogal /aN/ seria mais posterior do que /a/.
Os valores médios de F3 da produção acústica relativa à vogal /a/ dos dois grupos analisados estão muito próximos, ou seja, as aprendizes e as uruguaios apresentam, respectivamente, F3 de 3010Hz e 2942Hz, não havendo diferenças estatisticamente significativas (t(10)= - 0,533, p=0,606). Ao ser observada a produção relativa à vogal /aN/, constata-se que, nos dados das aprendizes, há uma elevação de F3 em relação à produção da vogal oral (F3=3319Hz), o que não ocorre nos dados das uruguaias (F3= 2988 Hz).
Essa diferença entre F3 de /aN/ na produção das aprendizes é significativa (t(10)= -3,531, p=0,005). De acordo com Quilis (1981: 150), ao mencionar as relações existentes entre frequências formânticas, observadas por Delattre (1948 e 1951), o autor cita que “existe uma relação direta entre a elevação frequencial do terceiro formante, F3, e o abaixamento do véu palatino, como na nasalização”. Esse pode ser mais um indício de que os aprendizes, ao produzirem a vogal relativa a /aN/, nasalizam essa vogal, enquanto as uruguaias não o fazem. Considerando que os estudos de Quilis (1999), Alcina Franch e Blecua (2001) e Navarro Tomás (1918) 2004) afirmam que a vogal /a/ se nasaliza quando ocorre, na borda esquerda da vogal uma consoante nasal pertencente ao onset e, na borda direita da vogal, uma consoante nasal que pode pertencer à coda da sílaba em que se encontra a vogal ou ao onset da sílaba seguinte20, ou ainda quando há pausa antes da vogal e esta é seguida por consoante nasal, analisaram-se em separado as vogais que se encontravam em contexto de nasalização no espanhol e as que não tinham contexto para a aplicação do processo alofônico.
Por essa razão, nas Tabelas 8 e 9, são fornecidos os valores médios de F1, F2 e F3 das nativas de espanhol e das brasileiras aprendizes de espanhol, considerando o contexto de nasalização (NVN ou //VN) e o contexto de preservação da vogal como oral (CVN).
A Tabela 8 revela que, nos dados das falantes nativas de espanhol, os valores de F1 não apresentam diferenças significativas da vogal nos dois contextos analisados (t(5) = 2,342, p=0,066). Esses índices parecem indicar que a vogal é produzida como oral mesmo quando a literatura prediz que a vogal deveria ser nasalizada.
Na Tabela 8, os valores médios de F2 não revelam diferenças significativas (t(5) = -1,870, p=0,120). O F3, no entanto, revela que há diferenças significativas entre os contextos CVN e NVN ou //VN (t(5)= -10,643, p=0,000); no contexto NVN ou //VN, o valor de F3 é maior, o que parece apontar, segundo Quilis (1981), para a nasalização da vogal baixa no contexto NVN ou //VN. Porém, como os dados referentes a /aN/, na Tabela 6, indicam não haver diferenças significativas em relação à vogal oral, não se pode concluir pela nasalização da manifestação fonética de /aN/, apesar das diferenças apontadas em relação a F3 (nos dois contextos nasais). Os valores de F1 reforçam essa constatação.
Na Tabela 9, observa-se um comportamento semelhante levando-se em conta os dois contextos investigados, ou seja, CVN e NVN ou //VN. Os testes estatísticos indicam que não há diferenças significativas entre os contextos CVN e NVN ou //VN, considerando-se os três formantes ((t(5) = 0,416, p=0,694, para F1; Z= -1,363, p=0,173 para F2; e Z= -0,105, p=0,917, para F3).
Levando-se em conta os valores de F1, verifica-se que as aprendizes de espanhol nasalizam a vogal baixa, assim como ocorre no PB, segundo Cagliari (1977), Sousa (1994), Seara (2000), Souza (2013) e Santos (2013), uma vez que, tanto em contexto CVN quanto em contexto NVN ou //VN, os valores de F1 são mais baixos e os de F3 mais altos se comparados com os valores apresentados para a vogal /a/, na Tabela 7.
Ao serem comparados os resultados das brasileiras aprendizes de espanhol com as falantes nativas de espanhol uruguaio, no que tange à produção relativa à vogal /aN/, observa-se que as aprendizes apresentam valores mais próximos dos parâmetros acústicos do PB, e, em consequência, mais distantes do espanhol, considerando-se, principalmente, os valores médios de F1 e de F3.
4.2. Duração Vocálica
Estudos que analisam vogais orais e nasais do PB, como os de Moraes e Wetzels (1992), Sousa (1994), Seara (2000), Campos (2009) e Santos (2013) (vejam-se dados da Tabela 2), afirmam que vogais nasais são sempre mais longas do que suas correspondentes orais.
Levando-se em consideração os momentos acústicos que constituem as vogais nasais (Sousa, 1994; Seara, 2000), no presente estudo, verificou-se, nos dados das nativas de espanhol, através da análise da trajetória dos valores de F1 nos cinco pontos coletados do script, que as produções referentes à vogal /aN/ são constituídas de apenas dois momentos acústicos, conforme pode ser observado na Tabela 10.
Na Tabela 10, relativa às nativas de espanhol, observou-se que 100% dos dados produzidos são formados por dois momentos acústicos: momento oral seguido de murmúrio nasal.
Com relação às aprendizes de espanhol, verificou-se, através da análise dos valores de F1 nos cinco pontos coletados do script, que as produções referentes à vogal /aN/ são constituídas, em sua grande maioria, de dois momentos acústicos, mas, também, de três momentos, conforme pode ser observado na Tabela 11.
Pela Tabela 11, relativa às aprendizes de espanhol, as produções referentes à vogal /aN/ são constituídas, em 98,33% dos dados, de dois momentos acústicos, ou seja, momento nasal e murmúrio nasal. Em apenas dois dados (1,67%), observou-se que as produções referentes à vogal /aN/ são formadas por momento oral nos três primeiros pontos (F11, F12 e F13), momento nasal nos dois últimos pontos (F14 e F15), e, por fim, murmúrio nasal. A observação desses momentos requer estudos mais aprofundados a partir da coleta não apenas de formantes orais, mas também de formantes nasais.
As Tabelas 12 e 13 fornecem os valores médios de duração absoluta, apresentados em milissegundos, e de duração relativa, em percentual, das produções relativas às vogais /a/ e /aN/ nos dados das nativas de espanhol e das brasileiras aprendizes de espanhol. Para a medição da duração das produções relativas a /aN/, considerou-se o murmúrio nasal, conforme Moraes e Wetzels (1992), Seara (2000) e Santos (2013). No caso das produções referentes à vogal /aN/, foram separadas as medidas de duração por contexto precedente ‘surda, sonora e sem contexto precedente’. Para as produções concernentes à vogal /a/, todos os contextos precedentes eram constituídos por consoante surda.
Quanto aos dados de falantes nativas de espanhol, a Tabela 12 mostra que, com relação à duração absoluta total (vogal+murmúrio), há diferença significativa entre as produções concernentes à vogal /a/, à vogal /aN/ com contexto precedente surdo, à vogal /aN/ com contexto precedente sonoro e à vogal /aN/ sem contexto precedente, como revela o teste Anova para medidas repetidas (F (3,15) = 103,097, p=0,000).
A comparação de pares de Bonferroni revelou que a duração absoluta total das produções referentes à vogal /a/ é significativamente menor do que as referentes à vogal /aN/ nos três contextos precedentes analisados. Esse resultado corrobora os achados encontrados, por Dias-Cavalheiro (2016), para palavras cognatas.
Os resultados das aprendizes brasileiras, concernentes à duração absoluta total (vogal+murmúrio), expressos na Tabela 13, revelam que há diferenças significativas entre as produções relativas à vogal /a/, à vogal /aN/ com contexto precedente surdo, à vogal /aN/ com contexto precedente sonoro e à vogal /aN/ sem contexto precedente, como revela o teste Anova para medidas repetidas (F (3,15) = 25,702, p=0,000).
A comparação de pares de Bonferroni revelou que a duração absoluta total das produções relativas à vogal /a/ é significativamente menor do que as referentes à vogal /aN/ nos três contextos precedentes analisados, o que corrobora os estudos de Moraes e Wetzels (1992), Seara (2000), Campos (2009) e Santos (2013), para o PB.
Esse resultado está em consonância com os resultados da Tabela 12, referente aos dados de falantes nativas de espanhol.
Os resultados expressos nas Tabelas 12 e 13 revelam, portanto, que as aprendizes brasileiras produzem uma vogal oral com maior duração absoluta total, em comparação com as nativas de espanhol, mas que os dados relativos à vogal /aN/ apresentam uma duração absoluta total similar nos dois grupos investigados.
Ainda os resultados referentes às durações relativas parecem corroborar as diferenças observadas em relação à duração total entre as vogais estudadas, tanto para as nativas do espanhol quanto para as aprendizes. No entanto, há um comportamento inverso da duração relativa, sendo maior para a vogal oral do que para a vogal em contextos nasais, à exceção da vogal sem contexto precedente. A relação entre a duração relativa das vogais em contexto nasal com contextos precedentes surdos ou sonoros está em conformidade com a literatura, que prevê que as vogais diante de consoantes sonoras são mais longas do que diante de consoantes surdas (vejam-se Tabelas 12 e 13). No entanto, os resultados referentes à duração relativa são ainda incipientes, uma vez que não foram rodados testes de significância.
5. Conclusões
Neste estudo caracterizou-se acusticamente a manifestação fonética da vogal /a/ do espanhol, em contextos oral e nasal, produzidos por falantes nativas de espanhol e por estudantes brasileiras de espanhol. Após a caracterização acústica da vogal baixa, compararam-se os resultados dos dados das aprendizes de espanhol, em contexto oral e nasal, considerando-se o comportamento acústico de vogais orais e nasais do PB fornecidos pela literatura, com os resultados relativos às nativas de espanhol, coletados especialmente para a presente pesquisa, bem como os fornecidos pela literatura.
Considerando os dados das brasileiras aprendizes de espanhol, observa-se que as produções referentes à vogal /aN/ têm valores médios de F1 menores do que os referentes à vogal /a/. Ao se observarem os dados acústicos das aprendizes e aqueles fornecidos pela literatura relativa ao PB (veja-se Tabela 1), considera-se que a diminuição dos valores de F1 nas produções referentes a /aN/ é provocada pelo abaixamento do véu palatino e o acoplamento do trato oral com o trato nasal, o que caracteriza a nasalização vocálica nos dados das aprendizes. Por outro lado, nos dados das uruguaias, observa-se que tanto as produções relativas à vogal /a/ quanto às relativas à vogal /aN/ apresentam valores médios de F1 bastante próximos, o que indica que essas vogais são produzidas de maneira muito semelhante, apontando para uma não nasalização da vogal diante de consoante nasal.
Os valores médios de F3 também indicam que a vogal /aN/ é produzida com nasalização pelas aprendizes brasileiras, já que, em relação à vogal /a/, ocorre um aumento da frequência do terceiro formante, enquanto, nos dados das uruguaias, os valores são bastante semelhantes, apontando para a produção de vogal oral.
As maiores diferenças entre as produções referentes às vogais /a/ e /aN/ nos dados das uruguaias dizem respeito ao F2, que tem sua frequência diminuída na vogal seguida de nasal comparando-se com a vogal oral.
Nos dados das brasileiras aprendizes de espanhol, ao ser analisada a vogal /aN/ em contexto CVN, em que, segundo a literatura não há nasalização vocálica, e em contexto NVN ou //VN, em que, conforme Quilis (1999), Alcina Franch e Blecua (2001) e Navarro Tomás (1918); 2004), há nasalização vocálica, conclui-se que não há diferenças significativas entre F1 das produções nos dois contextos. Nesse sentido, aproximam-se dos dados das uruguaias, em que não há diferenças significativas entre F1 em ambos os contextos. No entanto, as produções das brasileiras indicam a manifestação de uma vogal nasal em todos esses contextos, enquanto as produções das uruguaias indicam a manifestação de uma vogal oral para esses mesmos contextos.
Considerando a duração absoluta total, é possível verificar que as produções referentes à vogal /aN/ são sempre maiores do que as produções referentes à vogal /a/ nos dados das brasileiras aprendizes de espanhol e também nos das uruguaias.
É interessante observar ainda que as aprendizes de espanhol apresentam um comportamento semelhante à sua língua materna (PB), no que tange ao abaixamento de F1 e elevação de F3, na vogal /aN/, o que sugere a nasalização vocálica.
Considerando a duração absoluta total, os resultados mostram uma vogal oral mais longa nos dados das aprendizes em comparação com as nativas de espanhol. A partir dos resultados do estudo e considerando as diferenças entre a vogal /aN/ do português brasileiro e do espanhol, conclui-se que as aprendizes recorrem à sua língua materna, com relação ao comportamento acústico, em especial aquele que se refere aos valores de F1 e de F3. Lembra-se, no entanto, que os resultados aqui apresentados são relativos a aprendizes brasileiras com nível inicial de proficiência em espanhol. Portanto, as diferenças verificadas entre a presente análise e a pesquisa de Dias-Cavalheiro (2016) podem estar relacionadas aos diferentes níveis de proficiência das aprendizes brasileiras nesses estudos.
Cabe salientar ainda que, como etapa futura do estudo, pretende-se aumentar o número de participantes da pesquisa, considerando outros níveis de proficiência, bem como coletar, para as vogais em contexto nasal, além dos formantes orais, formantes nasais (quando presentes), que possam auxiliar na observação dos diferentes momentos acústicos.